A estatística de correlação entre as vazões de um período de cheia como estimativa do tempo de concentração de uma bacia hidrográfica


Contextualização

Versando sobre a análise de Séries Temporais, tive um insight acerca da aplicação desse tema na área de Recursos Hídricos, mais especificamente em Hidrologia.

Para provar minha hipótese teórica – indiscutivelmente inicial e beirando o contrassenso em todos os Multiversos – utilizei, como estudo de caso, a bacia hidrográfica do rio Xingu, com seção de controle no ponto de Altamira (HidroWeb - 18850000). Eu tinha como verdade que a série de vazões a ser testada deveria possuir, obrigatoriamente, um tempo de concentração na magnitude de dias e sabendo da área de drenagem na BHRX (~445.000 km2), esta constatação era, sem dúvida, verdadeira. De posse do hidrograma de cheias da BHRX e considerando uma janela temporal de 1995 a 2005, construí um gráfico (Figura 1) grifando dois períodos de cheias.



Utilizei a linguagem de programação R e os pacotes feasts (O’Hara-Wild, 2021) e tsibble (Cook et al., 2021) para realizar o tratamento e o processamento dos dados de vazão, desde a manipulação como série temporal até a obtenção dos resultados. A partir disso, verifiquei a correlação, apenas nas duas ondas cheias grifadas, entre a vazão do dia atual (d) e a vazão do dia anterior (d-1), obtendo, desta forma, n correlações, as quais possuíam exatamente o número de ordenadas de cada onda de cheia considerada.

Logo após isso, pude verificar até quando essa correlação permanecia forte, algo que embasei seguindo o estudo de Moriasi et al. (2015), aonde os autores indicam R2 > 0,70 como um enquadramento para uma modelagem hidrológica satisfatória. Embora não tenha relação com a modelagem hidrológica e partindo do pressuposto de que não há indicativos de valores satisfatórios de R2 no geral, optei por utilizar o referido estudo como premissa.

Nesse sentido, a correlação correspondente ao valor limítrofe entre R2 acima e abaixo de 0,70, foi aquela referente ao tempo de concentração estimado (para ambas as ondas de cheias consideradas). Sendo os resultados obtidos:

  1. Onda de cheia 2 (em laranja): 20 dias;
  2. Onda de cheia 1 (em verde): 15 dias;
  3. Tempo de concentração da BHRX calculado pela Equação de Giandotti (Silveira, 2005): aproximadamente 18,30 dias.

Mediante os resultados, observa-se uma margem de acerto entre 82% e 92% considerando as duas ondas de cheias frente ao tempo de concentração calculado. Apesar de ser um excelente indicativo que sim, o tempo de concentração de uma bacia hidrográfica pode vir a ser estimado, pelo menos em termos de magnitude, por estatística de correlação entre vazões de cheia, algumas ressalvas precisam, imprescindivelmente, serem consideradas:

  1. a metodologia proposta tende a apresentar resultados confiáveis em bacias hidrográficas com altos tempos de concentrações, na magnitude de dias;

  2. os hidrogramas utilizados como base para a estimativa do tempo de concentração devem possuir uma assinatura sazonal marcante, com períodos de cheia e vazante bem diferenciados, como é o caso do hidrograma ilustrado na Figura 1; e

  3. a escolha da onda de cheia não possui nenhum condicionante, mas baseado no próprio hidrograma da série histórica, é interessante a escolha de uma ou mais ondas de cheias unimodais, como aquelas escolhidas na Figura 1; é apenas uma sugestão tendo em vista que a multimodalidade da onda de cheia pode interferir na perda de correlação entre o dia d e o dia d-1.

Apesar das ressalvas, a metodologia proposta para a estimativa do tempo de concentração circunda muitas possibilidades de utilização, desde a facilidade em termos de cálculo, escanteando equações centenárias que foram desenvolvidas em outras localidades e podem não representar as realidades de algumas bacias hidrográficas até o acoplamento a modelos hidrológicos.


Referências:

Cook, D. et al. Package tsibble: Tidy Temporal Data Frames and Tools. 2021.

Moriasi, D. N. et al. Hydrologic and water quality models: Performance measures and evaluation criteria. Transactions of the ASABE, v. 58, n. 6, p. 1763-1785, 2015.

O’Hara-Wild, M. et al. Package feasts: Feature Extraction and Statistics for Time Series. 2021.

Silveira, A. L. L. D. Desempenho de fórmulas de tempo de concentração em bacias urbanas e rurais. Revista Brasileira de Recursos Hídricos. 10, 5-23, 2005.