Saneamento básico: um guia sobre o assunto

Figura 1- Saneamento, sociedade e meio ambiente

O saneamento básico é um conjunto de serviços de infraestrutura que engloba o abastecimento de água, o esgotamento sanitário, a limpeza urbana e o manejo de resíduos sólidos e a drenagem de águas pluviais. Esse um assunto de interesse nacional, pois impacta diretamente na vida de todas as pessoas e no desenvolvimento socioeconômico do país. As atividades que englobam esse serviço são essenciais para a prevenção de doenças, redução da mortalidade infantil, melhorias nos índices de educação e empregabilidade, preservação ambiental, expansão do turismo etc.

Apesar disso, o Brasil ainda tem muito o que avançar nessa área. Esse avanço passa por grandes investimentos públicos e privados no setor, por ações tomadas pelos governos federal e municipal para priorizar o tema, bem como pelo engajamento da população no consumo consciente e no bom funcionamento dos sistemas.

Saneamento, apesar de básico, é um assunto complexo, que impacta em diversas áreas da sociedade. Um exemplo é a relação entre saneamento básico e meio ambiente, fundamental para o bem-estar e a qualidade das vida. Além disso, várias atividades fazem parte desse serviço, que deve ser garantido por lei e envolve a participação de vários órgãos públicos de regulamentação.

Por isso, reunimos as informações mais importantes sobre saneamento básico e as mudanças trazidas pelo novo Marco Legal do Saneamento, sancionado em julho de 2020. Dessa forma, você pode se informar, entender melhor o assunto e, quem sabe, contribuir para a melhoria desse serviço na sua comunidade.

Definição de saneamento básico

Muitas pessoas imaginam que saneamento básico consiste apenas no acesso à água tratada e coleta e tratamento de esgoto, mas ele engloba outros serviços. Dessa forma, para iniciarmos nosso guia, é importante definir o que é saneamento básico.

Segundo o Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB), é o conjunto de serviços e infraestrutura de abastecimento de água, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, esgotamento sanitário e drenagem de águas pluviais urbanas.

É um serviço previsto na Constituição Federal e coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, órgão federal que surgiu a partir da fusão dos extintos Ministérios da Integração Nacional e das Cidades. O saneamento básico envolve a atuação de diversos agentes e pode ser prestado por empresas públicas e privadas, em regime de concessão, subdelegação, parcerias público-privadas, entre outros modelos de contratação.

Necessidade do saneamento básico

Entre os benefícios do saneamento básico estão o desenvolvimento do país e o aumento da qualidade de vida das pessoas. Seu aperfeiçoamento e universalização promovem melhorias na saúde, principalmente de crianças, com a diminuição da mortalidade infantil e a contenção de doenças, especialmente as de veiculação hídrica.

Além disso, há o desenvolvimento do turismo, da educação e a geração de novos empregos. Em um estudo do Instituto Trata Brasil (2018), ao projetar a universalização dos serviços de abastecimento de água e coleta e tratamento dos esgotos, o país teria um balanço positivo de R$ 1,1 trilhão, somando os benefícios gerados nos indicadores socioeconômicos.

Já o custo para levar saneamento básico para todos os brasileiros até 2033 é estimado em R$ 508 bilhões, sendo os serviços de água e esgoto responsáveis por 60% desse custo. Os estados que mais investiram em saneamento nos últimos anos foram São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e Bahia.

No entanto, para atingir essa meta, o Brasil precisa aumentar em 62% os investimentos em saneamento básico. A média de recursos direcionados ao setor nos últimos oito anos foi de R$ 13,6 bilhões, 8 bilhões a menos do que o necessário. Se essa média for mantida, a universalização só será atingida após 2050, ou seja, com um atraso de mais de 20 anos.

As atividades do saneamento básico

No nosso dia a dia, muitas vezes, não nos damos conta de como o saneamento básico está presente em nossas vidas. Algumas atividades já estão tão incorporadas em nosso cotidiano que não imaginamos mais nossa sociedade sem elas. Abaixo, detalhamos cada um dos serviços.

Captação, tratamento e distribuição de água

A água que chega à sua casa passa por processos de tratamento que a torna segura para ser utilizada para hidratação e higiene. Ela é captada em mananciais, passa por processos físicos e químicos e, então, é distribuída para as residências, indústrias e estabelecimentos comerciais.

Esse tratamento é realizado nas estações de tratamento de água (ETA) e é necessário para que a população não consuma água contaminada por sujeiras, vírus e bactérias, prevenindo a proliferação de doenças. Geralmente, nos serviços de saneamento básico nas capitais brasileiras e municípios, o processo de tratamento é realizado em 8 etapas:

1- captação: a água é captada de rios com impurezas, como areia, pedaços de plantas e bactérias;

2- adução:a água é bombeada para as ETAs;

3- coagulação: processo químico que favorece o agrupamento das impurezas da água;

4- floculação: processo mecânico de agitação para que as impurezas formem partículas maiores e decantem;

5- decantação: nessa etapa, os flocos formados anteriormente afundam, de forma que seja possível separar a água da sujeira;

6- filtragem: a água passa por filtros de areia grossa, fina, cascalho, pedregulho e carvão;

7- desinfecção: a água é desinfectada por cloro e recebe adição de flúor (em alguns casos);

8- reservação: a água é armazenada em reservatórios, que distribuem-na para a população.

Figura 2- Distribuição da água

Estima-se que 83,7% dos brasileiros tenham acesso ao abastecimento de água tratada. Isso significa que quase 35 milhões não contam com esse serviço básico.

No caso da população abastecida, o consumo médio de água é de 154 litros por habitante. Esse valor é acima dos 110 litros indicados pela Organização das Nações Unidas (ONU) para atender às necessidades de uma pessoa.

Coleta e tratamento de esgoto

A coleta e o tratamento de esgoto de imóveis e indústrias são serviços essenciais, não só para mantê-lo longe do contato com a população, como também para que o esgoto não polua os rios, lagos e oceanos, prejudicando os ecossistemas aquáticos e terrestres.

O esgoto é levado para as estações de tratamento de esgoto (ETE), que realizam uma série de procedimentos para tratá-lo e deixá-lo livre de resíduos sólidos e micro-organismos. Sendo assim, o efluente pode retornar à natureza despoluído e contribuir para a preservação do meio ambiente.

As ETEs são projetadas de acordo com o volume de esgoto que recebem, que é calculado, entre outros fatores, pelo tamanho da população. São realizadas, em boa parte dos sistemas disponíveis, 5 etapas de tratamento:

1- gradeamento: utilizado para remoção de materiais grosseiros, como lixo, pedaços de plantas, pedras etc.;

2- desarenação: nessa etapa, todos os detritos sólidos são retirados;

3- tratamento biológico: etapa responsável pela digestão da matéria orgânica presente no esgoto;

4- decantação: o lodo formado na etapa anterior é decantado e separado do líquido livre de impurezas;

5- descarte: após tratamento adequado, o esgoto é devolvido ao meio ambiente.

Figura 3- Estação de tratamento de esgoto

Estação de tratamento de esgoto

Apesar da importância desse serviço, apenas 54,1% da população tem acesso à coleta de esgoto. Além disso, menos da metade dos esgotos gerados no país passam por tratamento.

Ou seja, o esgoto de cerca de 100 milhões de brasileiros é despejado na natureza sem qualquer tipo de tratamento, prejudicando os mananciais e a fauna e a flora do entorno.

Manejo de água da chuva

A Lei nº 11.445/2007, chamada Lei do Saneamento, define o manejo de águas pluviais como “o conjunto de atividades, infraestrutura e instalações operacionais de drenagem urbana de águas pluviais, do transporte, detenção ou retenção para o amortecimento de vazões de cheias, do tratamento e disposição final das águas pluviais drenadas associadas às ações de planejamento e de gestão da ocupação do espaço territorial urbano”.

Ou seja, a drenagem e o transporte da água da chuva são realizados por meio das galerias pluviais, que transportam essa água até os mananciais, evitando, assim, alagamentos nas áreas urbanas.

Porém, há um problema muito grande nas cidades, que atrapalha o manejo da água da chuva: a falta de manutenção e o acúmulo de lixo nos bueiros. Além de entupir as redes de água pluvial, esse lixo polui os rios, lagos e oceanos.

Além disso, ligações entre a rede de esgoto e a de drenagem de água da chuva podem causar contaminação dos corpos d’água, transbordamento de esgoto para dentro do imóvel, enchentes, favorecer a transmissão de doenças infecciosas e causar problemas de infraestrutura para as cidades.

Manejo de resíduos sólidos

A ONU divulgou um estudo em 2018 apontando que o mundo produz mais de 2 bilhões de toneladas de lixo por ano! Imagina o que aconteceria se esse material não fosse recolhido e levado para um local específico.

Nesse contexto, a coleta de resíduos sólidos tem um papel importante na manutenção das cidades, pois recolhe o lixo produzido e dá uma destinação a ele. O destino ideal, caso haja separação do lixo, é o encaminhamento dos resíduos para reciclagem e do lixo, ou tudo aquilo que não pode ser reutilizado, reaproveitado ou reciclagem, para os aterros sanitários.

Esse serviço é regulamentado pelo município e pode ser realizado por empresas públicas ou privadas, que devem fazer a disposição adequada dos resíduos e rejeitos. O veículo que faz esse serviço é projetado para esse fim e, geralmente, faz o recolhimento em dias específicos em cada bairro.

Por isso, é importante saber o dia de coleta para que o lixo não fique exposto na rua por um longo período. Isso evita que a embalagem seja violada por animais e previne a disseminação de insetos e pragas, como ratos e baratas.

Além disso, você deve tomar alguns cuidados ao dispor seu lixo. Por exemplo, não é adequado deixar materiais perfurantes, como vidros e seringas, sem proteção nos sacos. Lembre-se de que uma pessoa vai manejá-los e isso pode causar acidentes.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), regulamentada pela Lei 12.305/2010, estabeleceu os princípios, objetivos e diretrizes para a gestão integrada e o gerenciamento de resíduos sólidos.

Um dos objetivos é o incentivo à indústria de reciclagem no Brasil. Sabe-se que esse é um assunto mundialmente importante, pois o consumo de plásticos passou a ser foco devido à dificuldade de degradação desse material na natureza.

Dessa forma, você pode contribuir para isso separando seu lixo e entregando-o a uma cooperativa de reciclagem ou aos catadores de material reciclável, que vendem esses resíduos. Fazendo pequenos ajustes no seu estilo de consumo também é possível diminuir bastante a geração desses resíduos sólidos.

A situação do saneamento básico no Brasil

O saneamento básico no Brasil começou em 1561, com a construção do primeiro poço, que abastecia a então capital, Rio de Janeiro. Porém, só mais tarde o serviço começou a ter os moldes que conhecemos hoje em dia.

Em 1971, o governo criou o Plano Nacional de Saneamento (PLANASA), e com isso houve a separação entre as instituições que cuidavam dessa área e da saúde. Nessa época, o serviço era prestado por companhias públicas.

Em 2007, foi aprovada a lei que regulamentou e deu diretrizes para o saneamento básico no Brasil. Hoje em dia, os municípios devem preparar seu Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB) com as políticas públicas, os planos e as metas que serão aplicadas no setor. Alguns órgãos fazem a fiscalização e o monitoramento da lei:

•Agências Reguladoras: responsáveis pela fiscalização da prestação dos serviços de saneamento nos municípios;

•Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS): sistema que reúne informações e indicadores sobre saneamento básico com dados obtidos dos próprios prestadores de serviço.

Segundo o Trata Brasil, as principais estatísticas sobre saneamento básico no Brasil são:

quase 35 milhões de pessoas não têm abastecimento de água tratada; entre crianças e adolescentes, 14,3% não têm acesso à água; há uma perda de 39,2% durante a distribuição de água para garantir o consumo da população — isso significa que boa parte da água captada se perde antes de chegar às residências, por problemas na infraestrutura dos sistemas; a região sudeste é a mais bem abastecida, com 91,1% da população com acesso à água tratada; cerca de 18% do abastecimento de água é feito por águas subterrâneas; quase 100 milhões de pessoas não têm acesso à coleta de esgoto; apenas 23 das 100 maiores cidades brasileiras tratam mais de 80% do seu esgoto; a região brasileira com maior índice de tratamento de esgoto é a Centro-Oeste, com 56,8%; apenas 49,1% dos municípios brasileiros têm um Plano Municipal de Saneamento Básico.

Figura 4- Taxa de internação por 100 mil habitantes nas regiões

Os caminhos para uma possível ampliação do saneamento básico

De olho nos problemas de diversos países em relação ao saneamento básico e outras questões ambientais, sociais e econômicas, a ONU criou a Agenda 2030, que contém os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O ODS 6 é o objetivo que visa garantir a universalização do acesso à água e ao saneamento para todos até 2030.

Para isso ser possível no Brasil, é fundamental a ampliação dos investimentos no setor. Por meio de investimento no saneamento básico, viabilizados principalmente a partir das mudanças promovidas pelo novo Marco Legal do Saneamento, é possível criar uma infraestrutura mais sólida e alavancar o desenvolvimento econômico e social do país.

Perspectivas para o futuro

Apesar dos problemas apontados, o saneamento básico no Brasil vem crescendo gradualmente. Como é um serviço que depende da administração pública e de investimento financeiro, sua universalização ainda vai levar um tempo para acontecer.

Nos últimos anos, foram aplicados entre R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões nesse setor. Se o Brasil continuar com essa média de investimento, estima-se que o país não conseguirá cumprir o plano de universalização do saneamento básico até 2033, objetivo estabelecido pelo Novo Marco.

Nesse ritmo, o Brasil só atingirá a universalização após 2050. Ou seja, o setor e os profissionais do saneamento básico clamam por investimentos públicos e privados para se desenvolverem e, assim, beneficiar o país em diferentes aspectos, como educação, saúde, meio ambiente, empregabilidade e turismo.

Texto retirado do blog Saneamento em Pauta (ADAPTADO)

(https://blog.brkambiental.com.br/saneamento-basico/)