RESÍDUOS SÓLIDOS NO BRASIL

1. INTRODUÇÃO

O Tratamento de Esgoto é de fundamental importância para a saúde da sociedade.Essa é uma das fragilidades críticas na Política Nacional de Saneamento Básico, onde os resultados indicam que menos de 50% do esgoto é coletado por redes sanitárias e encaminhados para Estações de Tratamento adequadas. Porém, esse problema torna-se ainda maior, quando avaliamos a qualidade deste tratamento e a disponibilidade dos seus rejeitos finais, denominado de Lodo Sanitário.

Os volumes de esgoto tratado no Brasil superam os 14,3 milhões de m3 por dia (IBGE, 2017). Considerando que, em média, 2% dos esgoto sanitário gera lodo, podemos inferir que são produzidos 0,28 milhões de m3 de lodo, que devem ser destinados adequadamente para disposição final todos os dias.Por outro lado, do ponto de vista das empresas operadoras do sistema de tratamento sanitário, o gerenciamento deste lodo tem custo médio estimado entre 20 e 60% do total gasto com a operação da ETE (BRINGHENTI et. al., 2018).

O Lodo Sanitário ocasiona uma elevação da taxa de percolado e, por consequência, elevação dos níveis do lago de chorume, impactando nos custos de manutenção do aterro, instabilidade dos taludes, riscos ambientais e sua vida útil (BRINGHENTI et. al., 2018). Não para menos, evidencia-se movimento dos aterros em buscar na justiça o amparo para não aceitar, mesmo com remuneração, o Lodo Sanitário entre seus insumos.

A disposição final do Lodo Sanitário obriga à soluções de disposição, por meio de tratamentos de recuperação ou elevada redução de volume, uma vez que este resíduo concorre com os demais resíduos sólidos na disposição final nos escassos aterros sanitários disponíveis no Brasil. Entre as rotas tecnológicas com potencial aplicação na redução do volume de lodo sanitário e transformação para matéria inerte identifica-se a Pirólise Lenta a Tambor Rotativo (PLTR), porém suas aplicações ainda são insipientes no Brasil, apesar de bastante aplicada na Europa e Japão (CHAMON, CARDOSO e BARROS, 2013).

Dessa forma, as soluções aplicadas no Brasil podem ser divididas em: (a) inadequada, quando lançados em corpos dágua, lixões ou terrenos baldios; (b) satisfatório, quando lançados em aterros sanitários e (c) adequado, quando reaproveitados para geração de energia elétrica, térmica ou compostagem.

2. OBJETIVO

Este trabalho tem por objetivo analisar os dados disponíveis decorrentes da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2017, quanto à disposição final do Lodo Sanitário decorrente das ETEs em operação no Brasil, de forma a avaliar o cenário de impacto ambiental com a disposição inadequada (corpos dágua, terrnos baldios e lixões) e adequada (reaproveitamento).

3. REVISÃO DE LITERATURA

Os resíduos sólidos podem ser classificados como resíduos no estado sólido e semissólido, que resultam de atividades da comunidade, de origem: industrial, doméstica, de serviços de saúde, comercial, agrícola, de serviços e de varrição, além de lodos provenientes de sistemas de tratamento de água, aqueles gerados em equipamentos e instalações de controle de poluição, assim como determinados líquidos que não devem ser descartados na rede pública de esgoto (ABNT, 2004).

O lodo de origem sanitária das cidades (frequentemente chamado de lodo de esgoto) é um subproduto do tratamento de esgoto. É normalmente uma mistura de matéria orgânica de resíduos humanos, partículas de resíduos alimentares, microrganismos, vestígios químicos e sólidos inorgânicos de produtos e até medicamentos que utilizamos, juntamente com água que está ligada a esses materiais. O lodo também pode vir de instalações industriais (fábricas de alimentos, de papel e celulose, fábricas de produtos químicos e combustíveis etc.). O lodo industrial é um subproduto de processos de fabricação específicos e difere amplamente em seu conteúdo para cada indústria.

A Pirólise é um método de degradação térmica de hidrocarbonetos na ausência de oxigênio que vem sendo utilizado para tratamento dos resíduos sólidos e geração de energia térmica ou elétrica (CONTI, 2009; CHAMON, CARDOSO e BARROS, 2013). Este processo requer uma fonte externa de calor para aquecer a matéria e a temperatura pode variar de 300ºC a mais de 1000°C (LEI/UFF, 2013). Pela definição já se observa que qualquer processo térmico a temperaturas superiores a 300°C e na ausência de oxigênio são considerados métodos de pirólise, o que torna o termo extremamente abrangente. Inicialmente, é possível fazer uma distinção quanto aos parâmetros de operação como tempo de residência dos resíduos e a temperatura a qual ele é submetido (LEI/UFF, 2013): • Pirólise Lenta - Processo a temperaturas superiores a 400°C e longos períodos de residência (40min – 1hora) em que a proporção dos produtos obtidos normalmente é 30% líquidos, 35% carbonáceos e 35% gases; • Pirólise Rápida - Processo a temperatura entre 400°C e 600°C e períodos de residência curtos (t < 2 seg) em que a proporção dos produtos obtidos normalmente é de 75% líquidos, 12% carbonáceos e 13% gases; e • Flash Pirólise - Processo a temperaturas superiores a 800°C e períodos de residência curtos (t ~ 1 seg), a proporção dos produtos obtidos normalmente é de 5% líquidos, 10% carbonáceos e 85% gases.

As diferentes tecnologias utilizadas para o tratamento de RSU não dependem exclusivamente de seus processos de aplicação, mas sim do contexto de sua aplicação quanto a finalidade, caracterização dos resíduos, formas de custeio e receita. No Brasil entretanto, não temos estudos que abordem de forma abrangente e aplicada as diferentes tecnologias mundialmente utilizadas para tratamento de RSU. Segue como base, as conclusões do Centro Nacional de Pesquisas da Itália (CNP) a respeito da tecnologia de pirólise aplicada em resíduos sólidos (CHAMON et al., 2013): • Os sistemas de pirólise, ao garantir a ausência de ar, permitem alcançar eficiências termodinâmicas superiores e resultados de emissão melhores através da remoção de substâncias nocivas antes da fase de combustão (CHAMON et al., 2013); • Os combustíveis produzidos (gás de síntese) são sensivelmente mais ricos que os obtidos através de processos de gaseificação, visto que não utilizam nenhuma forma de oxidação. Estas características tornam o processo ainda mais versátil e adequado para o aproveitamento energético (CHAMON et al., 2013); • O sistema pode ter dimensões reduzidas, podendo ser instalado em galpões relativamente pequenos no interior de áreas industriais (2000 m² máximo) (CHAMON et al., 2013); • O baixo impacto no território e no ambiente permite a aceitação da população local (CHAMON et al., 2013); • Ótimo rendimento global de conversão dos resíduos em calor, com significativa produção de energia elétrica (CHAMON et al., 2013); • O sistema reduz a dependência de aterros sanitários (CHAMON et al., 2013); • A flexibilidade da tecnologia permite também a destinação de resíduos hospitalares, de reciclagem de automóveis, lodo de ETEs e biomassa em geral (CHAMON et al., 2013). Os processos de pirólise utilizados para tratamento de resíduos sólidos urbanos que tiveram sucesso são quase que exclusivamente os que utilizam a tecnologia de Pirólise Lenta (LEI/UFF, 2013).

4. METODOLOGIA

A metodologia adotada neste trabalho compreende a aplicação de técnicas de análise de dados, considerando os seguintes dados: (a) Tratamento da base de dados para aplicação de técnicas de análise de dados, (b) programação em R; (c) análise dos resultados.

5. RESULTADOS E DISCUSSÕES

5.1. Carregamento da base de dados

A base de dados escolhida foi uma base em excel

library(readxl)
data <- read_excel("TABELA_LODO_Rev2.xlsx")
View(data)
head(data)
## # A tibble: 6 x 10
##   `Brasil, Grande Reg~ `Lançamento em co~ `Lançamento em terr~ `Lançamento em a~
##   <chr>                <chr>              <chr>                            <dbl>
## 1 Brasil               49                 367                               1126
## 2 Norte                1                  10                                  23
## 3 Nordeste             24                 177                                132
## 4 Sudeste              15                 88                                 630
## 5 Sul                  7                  31                                 252
## 6 Centro-Oeste         2                  61                                  89
## # ... with 6 more variables: Incineração <chr>, Reciclagem <dbl>,
## #   Tratamento inadequado <dbl>, Tratamento adequado <dbl>, População <dbl>,
## #   IDH (índice de Desenhvolvimento Humano) <dbl>

5.2. Separação dos dados por região e estados

regiao <- data[2:6,]
estado <- data[7:33,]
View(regiao)
View(estado)

5.3. Análise dos resultados

Média

mean(estado$`Tratamento inadequado`)
## [1] 0.3255766

Mediana

median(estado$`Tratamento inadequado`)
## [1] 0.2954545

Desvio Padrão

sd(estado$`Tratamento inadequado`)
## [1] 0.2305688

Gráfico 1 - Tratamento inadequado do lodo sanitário por região

barplot(regiao$`Tratamento inadequado`,main="Tratamento Inadequado por Região",ylab = "% Porcentagem",names.arg = regiao$`Brasil, Grande Região e Unidade da Federação`,ylim = c(0,1))

Pela média do percentual de ETEs com tratamento inadequado, observa-se que, mais de 30% das estações dispõem o lodo sanitário em corpos dágua, lixões e terrenos baldios. Pelo gráfico 1 - tratamento inadequado do lodo descartado por região, observa-se que as regiões nordeste e centro-oeste são as que proporcionam maior impacto sobre esse cenário desastroso, respectivamente com 57% e 41% de suas ETEs disponibilizando inadequadamente seus rejeitos. A região Norte do país apresenta 32% de suas estações, o que também conduz a elevação desse média nacional para valores alarmantes. Mesmo as regiões sul e sudeste, com reespectivamente 13% e 14% de suas estações disponibilizando inadequadamente o lodo sanitário, não pode ser consideradas como um resultado a ser aceitável.

Gráfico 2 - Tratamento adequado do lodo sanitário por região

barplot(regiao$`Tratamento adequado`,main="Tratamento Adequado por Região",ylab = "% Porcentagem",names.arg = regiao$`Brasil, Grande Região e Unidade da Federação`,ylim = c(0,0.1))

O gráfico de tratamento adequado do lodo sanitário por região confirma a situação de melhor desempenho da região Sul, com 4% das suas ETEs atuando para o reaproveitamento do lodo. As demais regiões são ainda mais inexpressivas, com resultados abaixo de 2,5%, demonstrando que uma conversão de lodo em resultados de reaproveitamento via aproveitamento energético, compostagem ou reaproveitamento de matéria orgânica não é uma realidade nacional.

Gráfico 3 - Tratamento inadequado do lodo sanitário por estado

barplot(estado$`Tratamento inadequado`,main="Tratamento Inadequado por Estado",ylab = "% Porcentagem",names.arg = estado$`Brasil, Grande Região e Unidade da Federação`,las=2)

Na análise dos dados observados por Estado, o Ceará é o pior estado, com 90% do total do seu lodo de ETE descartado inadequadamente, ou seja, em corpos d’água, terrenos baldios, lixões e aterros, seguido da Paraíba com 65% e Mato Grosso do Sul com 58%. Os dados apresentados confirmam a análise feita no gráfico 1, onde é demonstrado o Nordeste seguido do Centro Oeste sendo as regiões com os piores índices quando trata-se de tratamento inadequado de lodo sanitário.

Gráfico 4 - Tratamento adequado de lodo sanitário por estado

barplot(estado$`Tratamento adequado`,main="Tratamento Adequado por Estado",ylab = "% Porcentagem",names.arg = estado$`Brasil, Grande Região e Unidade da Federação`,las=2)

No gráfico do tratamento adequado por estado, ou seja, os estados que dão destinação adequada ao lodo sanitário, temos Sergipe com 18%, seguido de Alagoas e Rio Grande do Sul com 11% e Santa Catarina com 8%. Observa-se que Alagoas e Sergipe são os estados que colaboram significamente para o percentual do gráfico 2, com 2% do tratamento adequado realizado pela região Nordeste.

Correlação (de pearson) entre o IDH com o Tratamento inadequado - Somente estados

cor(estado$`IDH (índice de Desenhvolvimento Humano)`,estado$`Tratamento inadequado`,method = "pearson")
## [1] -0.2524137

Coeficiente de Determinação entre o IDH com o Tratamento inadequado - Somente estados

cor(estado$`IDH (índice de Desenhvolvimento Humano)`,estado$`Tratamento inadequado`,method = "pearson")^2
## [1] 0.06371269

O Coeficiente de Pearson foi adotado para avaliar a correlação entre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o percentual de ETE com disposição inadequada do lodo sanitário. Percebe-se que a correlação é negativa, ou seja, com maiores resultados do IDH tem-se menores resultados do tratamento inadequado. Porém, o coeficiente com -0,25 está abaixo do nível de significância (0,6) para permitir identificar a correlação entre as variáveis.

Correlação (de pearson) entre o IDH com o Tratamento adequado - Somente estados

cor(estado$`IDH (índice de Desenhvolvimento Humano)`,estado$`Tratamento adequado`,method = "pearson")
## [1] -0.1279347

Coeficiente de Determinação entre o IDH com o Tratamento inadequado - Somente estados

cor(estado$`IDH (índice de Desenhvolvimento Humano)`,estado$`Tratamento adequado`,method = "pearson")^2
## [1] 0.0163673

6. CONCLUSÃO

Pelos resultados e análises realizadas neste trabalho, pode-se afirmar que o reaproveitamento do lodo, de forma geral em todas as regiões e estados do Brasil é inexpressívo (abaixo de 5%), havendo ainda um destaque positivo para a região sul e os estados Sergipe, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

A disposição inadequada do Lodo Sanitário em corpos dágua, terrenos baldios e lixões é uma prática ainda recorrente no nordeste (mais de 60% das ETEs) e Centro-oeste (quase 50%), com destaque negativo para o estado do Ceará, Paraíba e Mato Grosso do Sul.

Por fim, fica patente a necessidade de investimentos na aplicações de rotas tecnologias para redução e reaproveitamento do lodo sanitário, tais como a citada aplicação da Pirolise Lenta a Tambor Rotativo.

7. BIBLIOGRAFIA

  • ABRELPE. Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil – 2020. Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, São Paulo, 2020.
  • BRINGHENTI, J. R.; BOSCOV, M. E. G.; PIVELI, R. P.; GÜNTHER, W. M. R. Codisposição de lodos de tratamento de esgotos em aterros sanitários brasileiros: aspectos técnicos e critérios mínimos de aplicação. Eng Sanit Ambient, v. 23, n. 5, p 891-899, 2018.
  • CHAMON, R.C.; CARDOSO, R.; BARROS, C.F.O. Tratamento de Resíduos Sólidos Urbanos, introduzindo uma nova tecnologia para o cenário brasileiro: Pirólise Lenta a Tambor Rotativo. In: I CONENGE, Niterói. ANAIS do Congresso, v.1. p.867-876, 2013.
  • INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa nacional de saneamento básico. Rio de Janeiro: IBGE, 2017.
  • LEI/UFF. Relatório de Controle Ambiental – RCA. Projeto de desenvolvimento de unidade de aproveitamento energético de resíduos através de tecnologia de pirólise a tambor rotativo na aplicação de solução socioambiental. Furnas Centrais Elétricas, Minas Gerais, 2013.