CAPITALISMO, TRABALHO E EDUCAÇÃO

Marcelo de Jesus da Mata –TAREFA – 05 – e-mail:

Adriano R. Mansanera –

1 – INTRODUÇÃO

O texto a seguir é o resumo solicitado como requisito parcial da disciplina. Na realidade, são resumos de dois autores que tratam da socialização e da relação do trabalho com a educação geral e profissional.

Há três subdivisões. A primeira é esta sucinta introdução. Após, a fundamentação teórica apresentando os resumos dos dois autores cuja leitura foi solicita; e, finalmente as considerações finais com uma resumida discussão e crítica dos textos.

2 – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 – J. Gimeno Gómez

Em sociedades primitivas, com grupos reduzidos de indivíduos, a educação dos jovens era pela socialização direta, ou seja, a participação dos mesmos na vida adulta. Com o decorrer do tempo, na História, os processos foram mudando de acordo com o contexto civilizatório, com várias formas de especialização do processo educativo. Existiu, por assim dizer, a institucionalização como uma atualização de uma socialização secundária (tutor, preceptor, academia, escola religiosa, escola laica, etc.) e contemporaneamente, sob a égide das sociedades industriais, a obrigação de escolas para garantir a reprodução social e cultural. Em contrapartida, as outras instâncias, a família, os grupos sociais; e, os meios de comunicação, passaram a ter uma influência marginal.

A escola é a responsável pela introdução progressiva de recursos para a vida adulta: as ideias, os conhecimentos, as concepções, as disposições e os modos de conduta. O que deu condição à sociedade industrial substituir os mecanismos de controle externo, das massas, por disposições internas. Desse modo, existe uma dicotomia: conservadorismo versus progressismo. A manutenção do status quo versus a busca de modificação dos aspectos da formação. O caminho parece ser o equilíbrio entre as duas tendências. A socialização é um fator muito importante no processo.

Socialização tem um caráter plural e complexo; pois, se baseia em objetivos, mecanismos e procedimentos para sua realização. Na sociologia da educação um ponto pacífico é que desde o surgimento das sociedades industriais a escola é o local de preparação da mão de obra. Entretanto, mesmo dentro dessa “pacificação” existe divergência quanto a significação do termo “preparação”. É um processo. Mas este permite resultados diferentes como corolários de um contexto de igualdade ou de desigualdade. São modelos e objetivos do processo de socialização na escola são a produção de um cidadão com condições de intervir na vida pública.

Para atingir objetivo delineado a escola deve assumir as contradições da sociedade contemporânea, em especial, a política e a economia. Há uma grande dicotomia entre economia e política. Na política, em princípio, em sociedades democráticas todos os cidadãos são iguais e tem o direito de desenvolver seus conhecimentos, suas ideias, suas atitudes e comportamentos. Em contraponto, a economia capitalista, cuja primazia é a propriedade privada, necessita do desenvolvimento do cidadão para sua incorporação ao trabalho assalariado, cujas características são: submissão e disciplina. E para corroborar, a escola precisa incorporar o individualismo, a competitividade e a não solidariedade. Existe o axioma: a escola é igual para todos. Entretanto, ideologicamente há contradição; pois, estimula o individualismo e o conformismo social. Assim, aparentemente aberta, há anúncios subterrâneos do desenvolvimento resultante das diferenças socioeconômicas, o que mina as possibilidades dos mais desfavorecidos.

Sendo a socialização na escola um processo, todo processo tem seus mecanismos. A sociedade, como um todo, acusa escola de inculcar e doutrinar ideologias. O fato é que a socialização, em especial na escola, resulta das práticas sociais estabelecidas pela própria sociedade em que a escola está inserida. O que são as interações sociais senão a troca de informações e aprendizagem. Pode-se dizer que grande parte do aprendizado é resultado das interações sociais dentro dos muros da escola. Boa parte, não como resultado de um currículo oficial desestimulante no qual estuda-se para passar nos exames. O conhecimento, não raro, esquecido horas depois. A interação social ensina aos alunos como se portar em sociedade, seu funcionamento, normas e valores. O que é muito valioso na indução de comportamento em relação ao trabalho e a vida.

Os mecanismos de socialização estão estruturados em tarefas escolares, relações sociais e na inter-relação entre ambas. Assim, para ser produtiva, existe a necessidade de uma concepção nova de atividade escolar e vivência em uma estrutura de relações compatíveis e convergentes. Goméz (1998) lista as seguintes:

  1. A seleção e a organização dos conteúdos do currículo. Concretamente, o que se escolhe e o que se omite da cultura pública da comunidade e quem tem o poder de selecionar ou intervir em sua modificação. 2 O modo e o sentido da organização das tarefas acadêmicas, bem como o grau de participação dos alunos na configuração das formas de trabalho.
  2. A ordenação do espaço e do tempo na aula e na escola. A flexibilidade ou rigidez do cenário, do programa e da seqüência de atividades.
  3. As formas e estratégias de valorização da atividade dos alunos. Os critérios de valorização, assim como a utilização diagnóstica ou classificatória dos resultados e a própria participação dos interessados no processo de avaliação.
  4. Os mecanismos de distribuição de recompensas como recursos de motivação extrínseca e a forma e grau de provocar a competitividade ou a colaboração.
  5. Os modos de organizar a participação dos alunos na formulação, no estabelecimento e no controle das formas e normas de convivência e interação.
  6. O clima de relações sociais presidido pela ideologia do individualismo e da competitividade ou da colaboração e solidariedade.

As contradições, do processo de socialização na escola, são complexas e sutis. Oriundas das resistências individuais e grupais dentro da mesma. É necessário considerar que a aula é um processo de negociação em que existem as resistências que minam a aprendizagem. E, que no médio e longo prazos podem não haver os resultados esperados. O professor somente tem acesso ao aparente; então, os intercâmbios ocultos ficam fora do seu domínio. Mais além, na escola existem demandas contraditórias. Em contrapartida oferece um sistema homogêneo de estrutura, por si, um impeditivo do desenvolvimento das ideias, atitudes e comportamento diferenciado. A grande contradição é que da escola exige-se um cidadão preparado para o trabalho assalariado ou burocrático no qual as virtudes são: a disciplina, a submissão e a padronização. Mas, a mesma, é cobrada pelo contexto de produção capitalista a formar cidadãos capazes para o trabalho autônomo onde a iniciativa, enfrentamento do risco e ser diferenciado contra a concorrência.

Compatibilização do trabalho, autônomo e assalariado, da vida social na democracia, consumo e família; e, cidadão que politicamente se diz com direitos iguais, mas no processo econômico é totalmente diferente. Na escola, existe a ideologia de igualdade; não tanto, a realidade mostra que existe classificação, exclusão de minorias e uma profunda diferenciação dos ingressos, uns chamados somente para o trabalho e outros para participação social mais efetiva. Em resumo, a escola suaviza as contradições com certa hipocrisia. Assim, a escola organiza o seu currículo de modo que resulte uma classificação social criando diferenças individuais e de esforço. Essa é a forma mais eficaz para socialização na desigualdade; pois, deste modo tornaram legítima desigualdade socioeconômica, mantendo a aparência de igualdade no âmbito político, tornando relevantes individualismo, a concorrência e a falta de solidariedade.

A escola tem funções: educativa e reprodutora. A primeira apoia-se no conhecimento público e tem o objetivo de criar conhecimento particular em cada aluno; e, a segunda, passar o conhecimento já consolidado para as novas gerações. O conhecimento público é composto pela experiência e reflexão ao longo da história podendo ir além do processo meramente reprodutor. A escola não é uma ilha, o contexto em que está inserida, ou seja, a comunidade e o processo sistemático de socialização interferem diretamente no processo educativo. Entretanto, esse conhecimento “bruto”, por assim dizer, precisa de uma mediação crítica utilizando o conhecimento acadêmico e científico. Em suma, a função objetivo da escola deve tornar-se o desenvolvimento radical da função compensatória, a reconstrução do conhecimento e da experiência do educando.

O desenvolvimento radical da função compensatória é necessária. A escola não sendo uma ilha tem internamente os mesmos problemas. Entretanto, pode atenuá-los, capacitando o individuo para lutar e se defender. Assim, a escola deve propor um modo de compensar as consequências da desigualdade. E, em vista disso deve trocar a lógica da homogeneidade pela lógica da diversidade. Deste modo a utilização de um modelo didático flexível natural podem atender as diferenças de origem dos alunos. Métodos uniformes atendem melhor os alunos oriundos de uma vida social estruturada. Para atingir a capacidade, a escola, deve buscar diversidade pedagógica que seja compreensiva e comum; e, só é possível com a formação docente coerente com o processo de fomentar as pluralidades das formas de viver, pensar e sentir, elevando o nível de tolerância social.

Há a necessidade de reconstruir os conhecimentos, as atitudes e as formas de conduta assimiladas anteriormente pelos alunos de forma acrítica. Esse é um processo cada vez mais comum devido a escola não ser mais hegemônica na distribuição e transmissão do conhecimento. A mídia de massa e a sociedade fora da escola são poderosos concorrentes. A mídia é quase toda composta por uma ideologia única que tem o objetivo de reproduzir a cultura dominante, dá pouco espaço para a reflexão e o debate aberto e racional. Assim, resta a escola cumprir a função de transmissão, distribuição, compreensão, apoiar-se na lógica da diversidade e diagnosticar a intoxicação ideológica. Para cumprir essa missão deve oferecer conhecimento público, fundamentado, para que o aluno questione, compare e tenha a possibilidade de reconstruir suas preconcepções, condicionamentos, condutas e relações sociais.

A escola provoca essa reconstrução; pois, tem condições de facilitar o processo de aprendizagem permanente. Levar o aluno a compreender que o todo, e também, o contexto que está inserido. Esse processo deve vir depois de uma reorganização do espaço. A reorganização da vivência, dos intercâmbios e dos estímulos. Os intercâmbios devem ser lastreados em solidariedade, colaboração e experimentação compartilhada. Os estímulos devem ser a busca, a comparação, a crítica, a iniciativa e a criação. Esse trabalho hercúleo requer a transformação das práticas pedagógicas, sociais e das atribuições dos professores sob um princípio básico: facilitar e estimular a participação ativa e crítica.

2.2 – Gaudêncio Frigotto

O ser humano pode ser definido em três dimensões: individualidade; consumo de recursos; e, as suas relações específicas com natureza e em sociedade. Diferente das outras formas de vida com quem compartilha a existência, o ser humano interfere diretamente em seu meio modo consciente. Essa intervenção pode ser chamada trabalho. Que pode ser criador, mantenedor e, também, entendido como um princípio educativo. De acordo com Marx o trabalho pode assumir duas dimensões: a de necessidade; e, de liberdade. O primeiro imperativo o de sobrevivência e manutenção da vida e o segundo usufruto do produto da satisfação ao primeiro imperativo.

Sendo o trabalho a origem da ciência e da tecnologia, o princípio educativo do trabalho tem dimensão de centralidade. É um dever e um direito que deve ser aprendido e realizado desde a infância.

Historicamente, nos últimos três séculos, o capitalismo regulou as relações de trabalho. Para seu pleno funcionamento necessitava de indivíduos livres: não proprietários dos meios e nem propriedade de outros. Assim, seriam forçados vender seu tempo de trabalho. Devido a assimetria relacional entre as classes sociais fundamentais, capitalistas e proletários, o trabalho e seus frutos têm seu valor de uso reduzido em detrimento ao valor de troca. Compreender os mecanismos de ambos, se faz necessário, para compreender a questão do trabalho e educação atualmente.

No século 20, houve a preocupação com a integração dos trabalhadores. Oriunda do fordismo e das políticas keynesianas, em parte como estratégia de controle; mas, também como resultado organização dos trabalhadores. Integração que resultou, mesmo desigualmente, em muitos direitos hoje gozados pelos trabalhadores. O trabalhador, não possuidor dos meios de produção, passa a ter garantias mínimas em termos humanos. O trabalho, além da remuneração, passa a ser um direito. Pelo menos nos países centrais; pois, nos periféricos não foi uma realidade. O Brasil é um exemplo. Entretanto, mesmo esses avanços começam a ruir, de modo assimétrico e global. As razões, embora muito amplas, tem fundamentos relativamente simples: a própria natureza de acumulação e rapina do capitalismo. As coletividades tiveram seu poder democrático usurpado pelas corporações multinacionais globais, enfraquecendo-as. Ou seja, tirando o poder do Estado de amortecer os impactos, fazendo aumentar a pobreza e a miséria.

A redução do poder dos estados nacionais impacta diretamente no financiamento da educação. A mesma que media todos os processos econômicos e sociais. Assim, os trabalhadores têm seus interesses diretamente ligados à educação. O tipo de educação que o estado capturado pelo capitalismo influenciará diretamente o tipo que será oferecida a classe trabalhadora. Para os países periféricos existe a estratégia filantrópica de meios compensatórios, aliás parte do Consenso de Washington dentro do neoliberalismo. Vinculada aos interesses, nacionais e internacionais, que visam uma educação subordinada a um desenvolvimento excludente, predatório e o concentrador de renda. Um mero processo de adestramento e acomodação não questionadora ainda que envelopada numa perspectiva de educação polivalente e abstrata. Em suma, apenas um indivíduo “empregável”. Mais um do exército de reserva de trabalhadores. Instituições neoliberais internacionais subordinam o pensamento dos dirigentes nacionais. No Brasil, a criação de instituições vinculadas a indústria, promove mais preferência por meio da captura do Estado, na educação profissionalizante. Formar trabalhadores que sob uma conjuntura deletéria e de não responsabilidade social destruição de empregos e renda, possam ser empregados mas sem perspectiva de longo prazo. Alguns não serão “empregáveis”. Para estes sobrará um tempo sem fim à procura de um emprego ou em subempregos.

E como seria a educação profissional sobre uma perspectiva emancipadora dos trabalhadores? Uma questão complexa; entretanto, pode ser resumida em cinco aspectos: solidariedade e igualdade; educação básica pública, laica, unitária, universal e centrada no direito subjetivo de cada ser humano; articulada para um desenvolvimento econômico sustentável; ser humano como centro e não o mercado e o lucro; e, articular organicamente relações sociais de produção e as relações políticas, culturais e educativas.

3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola é o primeiro ambiente de socialização e acesso ao conhecimento acumulado pela civilização. É um ambiente formativo que é composto por estrutura física, funcionários de apoio e professores. Essa estrutura demanda, sendo instituição pública, recursos originários do erário. Qual a origem do erário? Dos impostos. Assim, os impostos dos cidadãos e das empresas são financiadores em último caso da escola.

Frigotto (2001), parece defender a formação geral e profissional esteja descolada das necessidades de parte dos financiadores do processo. Em termos gerais, o desenvolvimento econômico é extremamente dependente de inovação tecnológica (novos produtos, processos ou ainda antigos com uma nova utilidade). Assim, uma escola utópica na qual os alunos se desenvolvam como ele preconiza criariam egressos capazes de gerar inovação? Talvez em uma economia planificada. Porém, os exemplos históricos entraram em derrocada. Pode-se citar China e Vietnã; entretanto, economicamente abraçaram um processo de nenhum suporte, aos moldes ocidentais, do trabalhador.

Gómez (1998) foi um pouco mais feliz em seus apontamentos quanto a necessidade de uma escola inclusiva, democrática, criativa, etc. No entanto, há a necessidade de que os alunos que estejam no processo escolar acumulem conhecimentos, capacidades e formações capazes não meramente para as relações sociais e saber “dar seu jeito” quando estiver em necessidade. O país precisa realmente de pessoas capazes de criar, acumular conhecimento, bem como, capacidade de aplicação para si e para sociedade. O autor deste texto, advoga a Indústria como criadora de riqueza social. Pois, exige capital intenso capital intelectual e paga vencimentos mais qualificados. Deste modo, a formação para o trabalho industrial qualificado, em especial na Indústria 4.0, precisa de egressos da escola com alta acumulação de conhecimentos e todas as áreas do saber.

Qualquer formação que não seja pragmática com a formação de riqueza social é meramente utópica. A curto prazo (acho que nem a longo) haverá a revolução do proletariado. Nas entrelinhas, ambos os autores advogam a soberania de um Estado sobre o indivíduo. Pode-se concordar que a coletividade é mais importante; entretanto, o indivíduo não pode ser esquecido. Os sonhos, as aspirações de cada indivíduo deve ter premência, se não prejudicar a coletividade, as pretensas aspirações coletivas. Numa sociedade capitalista o que emancipa de fato é capacidade de ser produtivo. A produtividade do trabalhador é o determinante da acumulação de riqueza pessoal e social. Os países centrais, só o são, devido sua capacidade de gerar produtividade mediante a uma educação forme pessoas produtivas. E um fator relevante para a produtividade é tecnologia que vem da inovação tecnológica que vem de uma educação formadora de pessoas produtivas. Um círculo virtuoso.

O Brasil só sairá do ciclo de “voos de galinha” quando desenvolver um processo educacional pragmático. Criar o círculo virtuoso de pessoas produtivas criando ciência e tecnologia. A falta de objetivos claros dos autores quanto os resultados da formação dos indivíduos denota uma ideia de sociedade não tem a necessidade de “sair do lugar”. Com dito acima, não haverá revolução do proletariado. A única revolução necessária é a educacional emancipadora do indivíduo consciente de si, da sociedade, do meio ambiente e da necessidade de avanço da humanidade por meio da ciência e tecnologia.

4 – REFERÊNCIAS

FRIGOTTO, G. Educação e trabalho: bases para debater a educação profissional emancipadora. Perspectiva, Florianópolis, v. 19, n. 1,p.71-87, 1 jan. 2001. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/article/view/8463. Acesso em: 08 dez. 2021.

GÓMEZ, A I Pérez. As funções sociais da escola: reprodução à reconstrução crítica do conhecimento e da experiência. In: SACRISTÁN, J. Gimeno; GÓMEZ, A. I. Pérez. Compreender e transformar o ensino. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 1998. Cap. 1.