Irmão Auguste,
Eu não sei como começar uma carta. Talvez esta seja a quinta ou sexta que inicio antes dos meus olhos começarem a transbordar e as lágrimas teimosas começarem a escorrer pelo meu rosto, manchando toda a tinta do papel. Talvez a quinta ou sexta — droga, não me lembro — carta que escrevo antes de amassar tudo e arremessar na lareira.
Há alguns anos — ok, talvez muitos anos porque eu era tão pequeno que não me lembro o momento exato que isto aconteceu, mas nunca esqueci de suas palavras — você pediu, com todas as letras, para sempre procurá-lo quando estivesse triste, me sentindo sozinho e, principalmente, quando precisasse conversar.
Bom.. as três coisas estão acontecendo neste momento. Eu me sinto triste, sozinho e preciso urgentemente conversar.
Uma vez você também me disse que eu sempre fui melhor que você em relação às palavras e talvez seja porque eu sempre preferi livros e você, espadas. Eu sempre gostei de passar horas imerso em universos e na minha imaginação, seja na biblioteca ou nos meus aposentos, sempre quieto e envolto a histórias, enquanto você gastava metade do dia na arena.
Enfim… eu precisava me expressar de alguma forma.
Estão construindo uma estátua para você, sabia? Na verdade, tenho quase certeza que ficou pronta esta manhã. Pelo o que ouvi, não se parece muito com você, mas seu corpo está lá. Eu ainda não criei coragem para ir, me desculpe, mas irei assim que puder. A corte inteira parece que enlouqueceu, muita correria e o luto ainda corre no ar, pois não só você se foi, como o pai também.
Merda, tem sido difícil sem você… Eu não acredito que você não voltou. Você prometeu que voltaria para mim, lembra? Eu sei que é a guerra — maldita guerra! — mas eu me lembro de você prometer que voltaria para ler aquele livro, para me botar na cama, para cavalgarmos juntos novamente. Olha, eu sei que você me deixava ganhar apenas para ver um sorriso no meu rosto — não negue! Desde os nove eu sei que sim — porém eu não me importaria de perder, desde que você estivesse ao meu lado uma última vez.
O tio se tornou Regente até que eu complete a maioridade. Eu achei que sempre carregaria o título de Príncipe de Vere, mas de uma hora para outra, todos começaram a dizer que minhas obrigações mudaram ou que eu nunca seria como você, que um dia me tornarei Rei de Vere e meu comportamento precisava mudar também.
Eu não quero mudar, eu só tenho 13 anos, Gus, por favor… volta por mim
Depois de Marlas, acho que só tenho um objetivo, que é me tornar excelente. Você era tudo o que eu tinha e Damianos me tirou isso, eu nunca vou perdoá-lo e acho que se vê-lo um dia, vou matá-lo irei tentar matá-lo… isso é uma promessa, irmão!
Por fim… o tio disse que irá cuidar de mim, eu me agarrei à ele, porque… ele foi minha única família que sobrou. Eu tenho medo de perdê-lo também, sabe? Medo que me deixe, eu não quero isso, então prometo me comportar.
Irei visitá-lo Gus, talvez eu fale mais com você depois, pessoalmente, perto do seu… caixão, merda, estou chorando de novo todavia, não deixarei de escrever, acho que consigo desabafar melhor assim.
A dor vai passar. Eu espero que uma hora a dor passe.
Seu irmão solitário e de luto, Laurent.