Este documento analisa os exercícos estatísticos e econométricos apresentados na Nota Técnica nº 77/2020–SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL de 25 de maio de 2020 e os comentários a eles relacionados coletados no âmbito da Consulta Pública ANEEL 035/2020 que tem como objetivo obter subsídios para o aprimoramento da Resolução Normativa que regulamenta o Decreto nº 10.350/2020. As referidas nota técnica e consulta pública abordam os aspectos financeiros que o estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública decorrentes da pandemia de Covid – 19 têm causado nas concessões e permissões de distribuição de Energia Elétrica.

Este documento segue a estrutura da nota técnica. Cada contribuição é adicionada após a citação do trecho da nota técnica que a motivou. Comentários sobre outras contribuições realizadas durante a consulta pública são feitos ao final da subseção “Redução de Receita em Função do Mercado”.

III – DA ANÁLISE

III.1. QUANTIFICAÇÃO DO PROBLEMA

III.1.1. Descrição do Problema

III.1.2. Redução de Receita em Função da Arrecadação

P4 da NOTA TÉCNICA

Na P4 da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020–SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL é é possível ler

  1. O conceito utilizado foi comparar a arrecadação verificada a cada dia com os faturamentos realizados cujo vencimento se dariam no mesmo dia. O gráfico a seguir apresenta o nível percentual de perda de arrecadação verificado no primeiro semestre de 2019, aqui utilizado como valor de referência, na linha azul. A linha amarela representa o nível total acumulado de perda de arrecadação desde o dia 18 de março de 2020, quando os impactos da pandemia se mostraram mais pronunciados. As linhas laranja e cinza mostram o crescimento marginal da perda de arrecadação desde 18 de março em dois recortes temporais: acumulado desde 18 de março de 2020 (cinza) e a média móvel de sete dias (laranja).

Ainda pertimente ao mesmo tópico, na P5 da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020–SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL é apresentada a estimativa

  1. Em grandes números, a perda de arrecadação do setor no primeiro semestre de 2019 foi de 2,4%, crescendo para 10,2% no período da pandemia. O impacto estimado da pandemia, portanto, é da ordem de 7,8% do faturamento realizado no período.

O texto é claro em apontar que a estimativa do impacto do COVID-19 obtida é baseada unicamente através dos dados da carga de 2019. Ressalte-se que, assim como o COVID-19 é um fator idiossincrático que afeta o ano de 2020, a metodologia utilizada ignora que há fatores idiossincráticos que afetaram o ano de 2019 também.

A literatura aponta que temperatura do ar é uma variáveis que mais impactam o consumo de energia elétrica, como pode ser visto em Cicala (2020). Se nos países do hemisfério Norte o maior impacto se dá no inverno, por conta de uso de equipamentos de aquecimento de ar, no Brasil o maior impacto da temperatura se dá no verão, quanto os aparelhos de refrigeração de ar são acionados. No caso de 2019, há evidências de que as medições de temperatura observadas neste ano foram superiores às observadas em 2020. A @ref(fig:temperaturas) apresenta as médias mensais das temperaturas médias e máximas para a cidade de São Paulo entre janeiro de 2001 e 27 de maio de 2020. Os dados meterológicos são provenientes da estação Sao Paulo (IAG), do Instituto Nacional de Meterologia (INMET). Os dados do IBC-Br foram obtidos com o pacotes BETS, de Ferreira et al. (2018).

A @ref(tab:tabelatemperaturas) apresenta as médias mensais das temperaturas médias e máximas para a cidade de São Paulo de janeiro de 2001 a maio de 2020. Nela é possível observar que a média das temperaturas médias diárias observadas no período selecionado pela ANEEL é três graus Celsius menor em 2020 do que em 2019. Quando consideradas as médias das temperaturas máximas, a diferença é de dois graus Celsius.

Médias mensais das temperaturas médias e máximas diárias no período de 18 de março a 17 de maio de cada um dos anos.
Médias Máximas
2015 21 24
2016 22 26
2017 21 25
2018 22 26
2019 22 26
2020 19 24
Fonte: INMET. Elaboração: FGV CERI.

Assim, recomenda-se que estimação dos efeitos do COVID-19 na carga e na receita das companhias de distribuição de energia elétrica considere mais de um ano de observações e um conjunto de variáveis explicativas para determinação da carga.

P8 da NOTA TÉCNICA

Na P8 da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020–SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL é apresentada a estimativa

  1. A figura a seguir monetiza o problema de perda de arrecadação. Busca responder à pergunta de quanto custa ao setor elétrico, diariamente, o crescimento marginal da perda de arrecadação verificada desde o início da pandemia. Trata-se do custo médio diário, desde 18 de março de 2020, da diferença entre os níveis de perda de arrecadação verificados no período da pandemia e aqueles verificados no primeiro semestre de 2019. A perda diária é da ordem de R$ 53,6 milhões, totalizando uma perda acumulada até o dia 17 de maio de aproximadamente R$ 3,3 bilhões. 19. A figura a seguir monetiza o problema de perda de arrecadação. Busca responder à pergunta de quanto custa ao setor elétrico, diariamente, o crescimento marginal da perda de arrecadação verificada desde o início da pandemia. Trata-se do custo médio diário, desde 18 de março de 2020, da diferença entre os níveis de perda de arrecadação verificados no período da pandemia e aqueles verificados no primeiro semestre de 2019. A perda diária é da ordem de R$ 53,6 milhões, totalizando uma perda acumulada até o dia 17 de maio de aproximadamente R$ 3,3 bilhões.
Fonte: Nota Técnica.

Fonte: Nota Técnica.

As mesmas observações aplicadas à subseção anterior cabem a esta, uma vez que a estimativa da perda de arrecadação é dependente do nível de carga e está sujeita aos mesmos fatores de variação.

P6 da NOTA TÉCNICA

P6 da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020/SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL é possível ler

  1. Os dados por distribuidora são apresentados na figura a seguir. As barras alaranjadas representam o nível de perda de arrecadação no período da pandemia, enquanto as barras azuis representam o período de referência (primeiro semestre de 2019). Nota-se, regra geral, forte elevação da perda de arrecadação. A Conta Covid tem por objetivo injetar liquidez nas distribuidoras na proporção da variação marginal da perda de arrecadação1, ou seja, a diferença entre as barras.
Fonte: Nota Técnica.

Fonte: Nota Técnica.

Ressente-se aqui da falta de dispobinilização dos dados por distribuidora. O acesso a tais informações permitiria realizar/replicar os mesmos exercícios, contribuindo para os princípios de transparência e análises fundamentadas por evidências - conforme preconiza a ANEEL.

P8 da NOTA TÉCNICA

Na P8 da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020–SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL é apresentada a estimativa

  1. A metodologia utilizada para estimar os valores de perda de arrecadação entre o início da pandemia e dezembro de 2020 consistiu em projetar no perfil da curva média Brasil apresentada pelas próprias distribuidoras2 , a média mensal dos valores apurados pela ANEEL entre o início da pandemia e 17 de maio de 2020.

Esta estimativa deve ser considerada tendo em mente que o cenário está em constante evolução. Note-se, por exemplo, que os padrões de isolamento social exigidos e praticados pelas autoridades certamente irão apresentar grande variação ao longo do ano.

Sobre III.1.3. Redução de Receita em Função do Mercado

III.1.3.2. Modelo Utilizado

P11 a da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020/SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL

Nos parágrafos 35 a 37 são apresentadas as regressões que, supostamente (a redação poderia ser mais clara), estimam a queda de consumo por grupo de consumidores para cada uma das ditribuidoras consideradas. A pergunta que cabe aqui é o porquê de não utilizar o market share de cada distribuidora e, a partir da queda na carga obervada e na tarifa praticada para cada um destes grupos, estimar a perda de receita. A nota de rodapé número 7 aponta que apenas 46 distribuidoras apresentaram dados com tal nível de desagregação. Indagamos se foi este o motivo de não ser fazer mais simples.

Na regressão aprensentada nos parágrafos 33 e 34, a única medida de qualidade de ajuste apresentada é o \(R^2\). Em nossa avaliação, cabe apresentar outras medidas de qualidade de ajuste.

P11 da NOTA TÉCNICA

Na P11 da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020/SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL, de 25/05/2020 é possível ler:

  1. Dessa forma, utiliza-se no Cenário 2 os resultados do modelo de Regressão Linear Fuzzy - RLF, proposto por Tanaka, Uejima e ASAI (1982)10, e detalhado por Ross (2010)11. Adotou-se o modelo não difuso, função de pertinência triangular simétrica. Como dados de entrada, utiliza-se o PIB real trimestral12 e variação de mercado trimestral SAMP (ano de referência contra ano-1).

Há algums pontos que devem ser observados em relação a este parágrafo. O gráfico @ref(fig:indicescargaeatividade) apresenta a relação entre a carga mensal total dos sistemas interligados do Setor Elétrico Brasileiro (SEB) e o Índice de Atividade Econômica do Banco Central do Brasil (IBC-Br) no período de 2003 (ano em que esta série começou a ser publicada) e o último dado disponível de cada uma das séries (abril para a carga e março para o IBC-Br). Ambos índices estão apresentados com base 100 em dezembro de 2002 para que a comparação entre a evolução das duas séries seja mais conveniente. Os dados de carga foram obtidos no site da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) para cada um dos submercados, e agregados diariamente e nacionalmente. Os dados do IBC-Br foram obtidos por meio do pacote BETS, Ferreira et all. (2018), da linguagem estatística R.

A análise descritiva das séries oferece alguns elementos importantes para a metodologia econométrica que deve ser perseguida.

  1. Ambas apresentam comportamento típico de séries temporais não estacionárias. Esta observação recomenda a realização de testes de estacionariedade antes de que a relação entre as duas estimada.

  2. Caso seja concluído que ambas as séries são não estacionárias, a literatura indica que deve ser estimado um modelo de cointegração.

  3. Caso seja verificada uma relação de longo prazo entre as duas variáveis, deve-se investigar a existência de relações de causualidade de Granger e, a partir daí, estimar os efeitos de uma variável sobre a outra. O chamado Modelo de Correção de Erros é aplicável. Estes efeitos são extremamente importantes para incorporar adequadamente os efeitos dinâmicos na previsão.

No documento e no parágrafo citado é apresentada uma técnica não usual de estimação da relação entre as séries estudadas. A técnica não testa a não estacionariedade das séries que geraram as observações das variações utilizadas, nem considera a possibilidade de cointegração nas séries de atividade econômica.

Além destes pontos, a relação entre as duas séries sugerida pelo gráfico alimenta a suspeita de quebra estrutural, principalmente a partir de 2014 - ano em que a economia nacional entra em recessão-, mas a carga de eletricidade parece acompanhar este movimento. Esta possibilidade de quebra estrutural, já reconhecida por muitas àreas comerciais de distribuidoras de energia elétrica, que têm causado dificuldades em seus profissionais no exercício de previsão de mercado, motivou o uso de séries mensais. Veja-se que, dada a quebra estrutural, é necessário identificar janelas de observações que apresentem possível relação de longo prazo. Este exercíco é delicado, uma vez que implica, necessariamente, a perda de muitos observacões. Considerando que há alguma estabilização a partir de 2017, teríamos, então, pouco mais de doze observações trimestrais para estimar uma relação de longo prazo. Segundo as melhores melhores referências, esse número de (12) observações não é suficiente, principalmente quando se consideram que os efeitos defasados devem ser testados. Juselius (2008) é uma excelente referência sobre o tema.

P11 da NOTA TÉCNICA

Na P11 da NOTA TÉCNICA Nº 77/2020/SGT/SFF/SRM/SRD/GMSE/ANEEL, de 25/05/2020 é possível ler

  1. Toda a modelagem consta da aba “Cenários Mercado PIB (RLF)” da planilha a ser disponibilizada em apenso à presente Nota Técnica, sendo que para a solução é utilizada a ferramenta solver do Excel, modelo Simplex. A figura abaixo apresenta a distribuição dos dados, bem como regressão linear e RLF.
Fonte: Nota Técnica.

Fonte: Nota Técnica.

A utilização de técnicas econométricas de séries temporais permitiria que a dinâmica do efeito da atividade econômica sobre a carga fosse estimada, sem a necessidade de impor uma hipótese. Ressalte-se que a escolha de um modelo de cross section não permite que os efeitos defasados de uma série sobre a outra sejam adequadamente estimado.

Comentários sobre as contribuições na seção mercado

Na análise dos documentos disponíveis na CP ANEEL 035/20, identificou-se um conjunto de contribuições versando sobre os efeitos do COVID-19 no mercado das distribuidoras com base em aspectos técnicos de estatística e econometria que também foram objeto da contribuição do FGV CERI. Esta seção analisa de modo suscinto os argumentos apresentados por esses agentes.

RegE Consultoria - primeira contribuição

Na primeira contribuição da RegE pode ser lido

Inicialmente, cabe comentar que a adoção do modelo de regressão linear fuzzy (RLF) em relação ao Cenário 1 nos parece acertada. Não só por ser mais conversador quanto à retomada do mercado, o que é aconselhável neste momento de incerteza quanto às consequências da pandemia, como também por ser o mais adequado, uma vez que possibilita atualizações semanais do PIB, a partir de novas publicações do Boletim Focus do BACEN.

A referência à Regressão Logística enseja um aprofundamento sobre o tema. Segundo Shapiro (2005), existem algumas situações em que a Regressão Fuzzy seria convenientemente usada no lugar da regressão linear simples. São elas:

  • Pequeno conjunto de dados;
  • Dificuldades em se verificar as hipóteses das distribuição adotada;
  • Imprecisão na relação entre as duas variáveis;
  • Ambiguidade entre os eventos e no grau em que eles ocorrem;
  • Inacurácia e distorção introduzidas por linearização.

Sobre estes aspectos, vale observar que:

  • Caso fossem utilizados dados com periodicidade mensal, como sugerido neste documento, haveria três vezes mais observações para estimar a relação de interesse para qualquer período escolhido;
  • O aumento significativo do número de pontos permitira que os procedimentos usuais de verificação de hipóteses do modelo poderiam ser utilizados;
  • É ponto pacífico entre os participantes do setor elétrico que a carga e a atividade econômica são relacionados. A questão aberta sobre isto está relacionada à estabilidade desta relação ao longo do tempo. Sendo assim, deve-se modelar a relação de longo prazo entre as variáveis considerando possíveis quebras estruturais. Maki (2012) e Gregory e Hansen (1996) são boas referências sobre este ponto.
  • As questões de ambiguidade endereçadas pela lógica fuzzy não são observadas no problema em análise;
  • Não há exercício de linearização no problema em questão. A própria regressão aprensentada na nota técnica não sugere dúvidas a respeito da linearidade da relação entre as variáveis.

Diante destes pontos, argumenta-se que as condições apontadas por Shapiro(2005): (i) não são observadas; (ii) ou que podem contornadas com facilidade, como no caso do número de observações para a realização dos exercícios econométricos.

A RegE apresenta duas justificativas para o uso da Regressão Fuzzy. Primeiro, aponta que a Regressão Fuzzy é a escolha mais adequada pelo fato do método “conservador”, o que seria mais aconselhável neste momento de “incerteza”. Com relação a esse ponto, a incerteza se dá em relação ao cenário prospectivo, não em relação à qualidade ou precisão dos dados utilizados na análise. Trata-se de dados do PIB calculados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), obtidos pelo autor da regressão por meio do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e do Sistema de Acompanhamento de Informações de Mercado para Regulação Econômica (SAMP).

A segunda justificativa apontada pela RegE diz que a escolha “possibilita atualizações semanais do PIB, a partir de novas publicações do Boletim Focus do BACEN”. Esta característica não é decorrente da escolha da regressão Fuzzy. As projeções de PIB podem ser utilizadas para realização de projeção de carga em modelos estimados por outros métodos. No caso da utilização de modelos com dados mensais, há uma outra vantagem adicional: os modelos podem (e devem) ser reestimados e avalidados com frequencia três vezes maior.

Uma possível objeção ao uso do IBC-Br é que ele não seria exatamente o PIB. Sobre este aspecto, o Estudo Especial nº 3/2018, publicado pelo Banco Central do Brasil, apresenta o seguinte parágrafo em sua conclusão

Em resumo, o IBC-Br e PIB são indicadores agregados de atividade econômica com trajetórias similares no médio prazo. Há características que os diferenciam tanto do ponto de vista conceitual quanto metodológico: o IBC-Br, de frequência mensal, permite acompanhamento mais tempestivo da evolução da atividade econômica, enquanto o PIB, de frequência trimestral, descreve quadro mais abrangente da economia. Além disso, o processo de dessazonalização pode contribuir para ampliar as diferenças pontuais entre os dois indicadores, ensejando cautela em comparações nos horizontes mais curtos. No entanto, essas diferenças tendem a se compensar ao longo do tempo, favorecendo as comparações em horizontes mais longos, como a anual.

A frase final da citação é clara em apontar a adequação do uso do IBC-Br para a previsão do PIB em períodos de um ano. Ressalte-se que as previsões para o PIB do Relatório Focus, fonte usada para obtenção das projeções de atividade na nota técnica e amplamente aceita, são feitas para períodos anuais. De fato, o Banco Central do Brasil construiu este índice para que dados sobre a atividade econômica do Brasil estivessem disponíveis com uma frequência maior do que a do PIB - que é trimestral e divulgado com uma defasagem de cerca de um mês e meio.

Gupo Neoenergia

Na contribuição do Gupo Neoenergia pode ser lido"

“Inicialmente, cabe comentar que a adoção do modelo de regressão linear fuzzy (RLF) em relação ao Cenário 1 nos parece acertada. Não só por ser mais conversador quanto à retomada do mercado, o que é aconselhável neste momento de incerteza quanto às consequências da pandemia, como também por ser o mais adequado, uma vez que possibilita atualizações semanais do PIB, a partir de novas publicações do Boletim Focus do BACEN”.

Os mesmos comentários aplicados à primeira contribuição da RegE se aplicam aqui.

RegE Consultoria - segunda contribuição

Na segunda contribuição da RegE está escrito

Para tanto, em relação ao horizonte de análise, recomenda-se considerar que os impactos da crise devem ser duradouros e que é improvável que a carga de energia retorne para o patamar normal em janeiro de 2021. Nesse sentido, a Nota Técnica nº 045/2020-SRG/ANEEL, de 14/05/2020, e o voto condutor, que fundamentaram a decisão da diretoria colegiada da ANEEL em anuir com a Revisão Extraordinária da Previsão da Carga do Planejamento Anual da Operação Energética (PEN), apontou que a carga originalmente prevista para 2020 só será alcançada em 2022.

Nota-se aqui que há uma preocupação grande com relação à trajetória que a economia irá apresentar no futuro, mas, por outro lado, o modelo estático estimado por meio de uma Regressão Fuzzy não contempla a dinâmica dos impactos da atividade sobre a carga e vice-versa. A utilização de um modelo de correção de erros, como apontado anteriormente neste documento, permitiria que a dinâmica de entre estas duas variáveis fosse estimada a partir dos dados.

Grupo EDP Energias do Brasil

Na primeira contribuição do Grupo EDP Energias do Brasil consta que:

“No que diz respeito a equação que relaciona Mercado e PIB, verifica-se conforme item 1.2.1 da contribuição da EDP, que modelos lineares não capturam a relação de endogeneidade entre essas duas variáveis, motivo pelo o qual deveriam ser utilizados modelos de Vetores Auto Regressivos (VAR) ou Vetor de Correção de Erros (VEC). Dessa forma, modelos lineares aplicados a esse tipo de problema promovem resultados espúrios do ponto de vista estatístico.”

A contribuição aponta a necessidade do uso do modelo de correção de erros para capturar corretamente a Causadalidade de Granger entre as duas séries. Ou seja, ressalta- que é importante identificar se variações da atividade causam efeitos defasados na variação da carga e vice versa. Esta ideia está relacionada à necessidade de se utilizar uma especificação econométrica que contemple de forma adequada os aspectos dinâmicos características de séries econômicas, tópico já fartamente apontado ao longo deste documento.

Grupo EDP Energias do Brasil - segunda contribuição

Na segunda contribuição do Grupo EDP Energias do Brasil está escrito

No dia primeiro de junho, o Boletim do Banco Central divulgou nova previsão para o ano de 2020, alterando-o de 5,12%, cenário utilizado pela ANEEL, para 6,25% , reforçando o fato de que as premissas da ANEEL, para além de superestimar o mercado, devido aos problemas verificados no modelo linear, assim como a desconsideração das perdas não técnicas, conforme contribuição da EDP, subestima a efetiva redução de carga.

A contribuição reforça o erro de especificação causado pelo uso do modelo estático e aponta para a necessidade de atualizações mais frequentes, o que reforça o apelo por modelos que usem dados mensais.

Grupo EDP Energias do Brasil - terceira contribuição

Na terceira contribuição do Grupo EDP Energias do Brasil está escrito

O mercado de consumidores das distribuidoras conta com peculiaridades que podem não estar retratadas na projeção simplificada. Migrações dos clientes para a rede básica, fechamento e redução da produção por parte das indústrias e comércio, além da maior sensibilidade da indústria local às exportações para a China, podem agravar os impactos da pandemia.

Importante considerar a possibilidade de que o mercado estimado poderá ser ainda menor, mediante a aplicação de um fator de ajuste, resultando em um “colchão” de segurança a todas as distribuidoras. Trata-se de um fator que pode ser único para o Brasil, por exemplo, em torno de 5% do mercado faturado esperado para o ano de 2020, ou acordado, respeitadas as especificidades do mercado de cada distribuidora.

A contribuição aponta para outro problema apontado ao longo desta análise: a regressão que estabelece um modelo de queda de carga para todas as distribuidoras poderia ser substituída por um método que contemple de maneira mais precisa as variações de carga por classe de consumidores para cada concessionária. O método proposto neste documento é uma alternativa que deve ser considerada.

Comentários finais

O conteúdo deste documento apresenta evidências inequívocas de que há grandes oportunidades de aprimoramento dos métodos de previsão de cargas utilizados no Sistema Elétrico Brasilleiro (SEB). As distribuidoras de eletricidade no Brasil convergem para o conceito de Utilities of the Future: experimentam processo inequívoco e irreversível de digitalização, aprofundado pela necessidade de adaptação na crise da pandemia do Covid-19. Sua vocação é digital, ou seja, são grandes usuárias de tecnologia, dados e dotadas de grande capacidade de transformar dados em valor efetivo a seus stakeholders (acionistas, consumidores e sociedade). Cabe ao regulador se adaptar nesse processo. A Conta Covid, operação de alívio de capital para as companhias do setor, contempla limite de financiamento individualizado para cada companhia. Por certo que no momento da crise cabe empoderar as companhias e dotá-las de instrumentos para que mantenham condições de prestação adequada de serviços. Ainda assim, cabe ao regulador fazer uso dos melhores instrumentos e metodologias para analisar o impacto da crise no setor, coerente com a busca de evidências e transparência em seus processos. Conhecimento consolidado na literatura e avanços recentes em Ciência de Dados, Econometria e Estatística são elementos chave no processo de digitalização do SEB. A utilização do estado da arte do conhecimento nestas cências para o aprimoramento das previsões e estimação de impactos exógenos na carga dos componentes do SEB se constituem em excelente oportunidade para avançar em direção às Utilities 4.0.

Referências

Cicala, S., Early Economic Impacts of COVID-19 in Europe: A View from the Grid, 2020. Disponível aqui.

Banco Central do Brasil, Estudo Especial nº 3/2018, Aspectos metodológicos e comparações dos comportamentos do IBC-Br e do PIB, 2018. Disponível aqui.

Ferreira et al., BETS: Brazilian Economic Time Series, 2018.

Gregory, A. W., Hansen, B. E., Residual-based tests for cointegration in models with regime shifts, Journal of Econometrics, Volume 70, Issue 1, January 1996, Pages 99-126, 1996.

Juselius, K. The Cointegrated Var Model, Mehodology and Applications, Advanced Texts in Econometrics,Oxford, 2008.

Maki, D., Tests for cointegration allowing for an unknown number of breaks, Economic Modelling Volume 29, Issue 5, 2011-2015, 2012.

Shapiro, A. F., Fuzzy Regression Models, Working Paper, Penn State University, disponível aqui.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.