Recentemente, uma megaoperação policial realizada nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, resultou em 117 suspeitos mortos e quatro policiais mortos, configurando a ação mais letal já registrada no país. A operação mobilizou aproximadamente 2,5 mil agentes com o objetivo de cumprir mandados de prisão e busca em territórios dominados pelo crime organizado. O episódio reacendeu debates intensos sobre os limites da atuação estatal, a legitimidade do uso da força e a forma como a sociedade interpreta e julga a violência policial — questões que atravessam o campo da segurança pública, da justiça criminal e dos direitos humanos no Brasil.
Para aprofundar essa discussão, este trabalho utiliza dados da Pesquisa Social Brasileira (PESB 2002), um levantamento nacional que investigou percepções da população sobre o papel da polícia e a aceitabilidade da violência institucional. A partir desses dados, analisaremos como diferentes grupos sociais compreendem a violência policial, especialmente considerando marcadores sociais como cor/raça e gênero.
Serão apresentados dois gráficos que relacionam:
Cor/raça e a violência institucional;
Gênero e a violência institucional.
Essas visualizações permitirão identificar padrões, possíveis desigualdades e nuances na forma como distintos segmentos da sociedade avaliam a atuação policial. A partir delas, busca-se promover uma reflexão crítica sobre como fatores sociodemográficos influenciam a construção de opiniões sobre violência e segurança pública no Brasil.
pesb <- read_xlsx(path = "subconjunto_pesb_2002.xlsx")
impacto_cor <- pesb %>%
select(cor_raca, a_policia_matar_assaltantes_ladroes_depois_de_prendelos_e_uma_situacao) %>%
filter(cor_raca == 'Preto' | cor_raca == 'Pardo' | cor_raca == 'Moreno' | cor_raca == 'Branco') %>%
mutate(violencia_institucional = a_policia_matar_assaltantes_ladroes_depois_de_prendelos_e_uma_situacao) %>%
mutate(violencia_institucional = ifelse(violencia_institucional == 'Sempre errada', 'Não concorda', violencia_institucional)) %>%
mutate(violencia_institucional = ifelse(violencia_institucional == 'Errada na maioria das vezes', 'Não concorda', violencia_institucional)) %>%
mutate(violencia_institucional = ifelse(violencia_institucional == 'Não concorda', 'Não concorda', 'Concorda')) %>%
mutate(cor_raca = ifelse(cor_raca == 'Branco', 'Branco', 'Preto')) %>%
select(violencia_institucional, cor_raca) %>%
table() %>%
as.data.frame() %>%
arrange(violencia_institucional)
ggplot(data = impacto_cor) +
geom_col(aes(x = Freq, y = violencia_institucional, fill = cor_raca), position = 'dodge')
impacto_genero <- pesb %>%
select(genero, a_policia_matar_assaltantes_ladroes_depois_de_prendelos_e_uma_situacao) %>%
mutate(violencia_institucional = a_policia_matar_assaltantes_ladroes_depois_de_prendelos_e_uma_situacao) %>%
select(genero, violencia_institucional) %>%
mutate(violencia_institucional = ifelse(violencia_institucional == 'Sempre errada', 'Não concorda', violencia_institucional)) %>%
mutate(violencia_institucional = ifelse(violencia_institucional == 'Errada na maioria das vezes', 'Não concorda', violencia_institucional)) %>%
mutate(violencia_institucional = ifelse(violencia_institucional == 'Não concorda', 'Não concorda', 'Concorda')) %>%
select(violencia_institucional, genero) %>%
table() %>%
as.data.frame() %>%
arrange(violencia_institucional)
ggplot(data = impacto_genero) +
geom_col(aes(x = Freq, y = violencia_institucional, fill = genero), position = 'dodge')
A análise dos dois gráficos evidencia que tanto gênero quanto cor/raça influenciam as opiniões da população brasileira em relação à aceitabilidade da violência institucional praticada pela polícia. No gráfico por gênero, observa-se que homens e mulheres majoritariamente não concordam com esse tipo de violência; entretanto, a proporção de discordância é ligeiramente maior entre as mulheres, sugerindo uma postura mais crítica ou menos tolerante ao uso excessivo da força pelo Estado.
Quando observamos o recorte racial, o padrão se mantém: indivíduos brancos e pretos, em sua maioria, não consideram justificável a violência policial. Contudo, nota-se que a discordância é um pouco mais elevada entre pessoas brancas, enquanto pessoas pretas apresentam proporção relativamente maior de concordância quando comparadas ao grupo branco. Esse resultado pode refletir experiências distintas de contato com instituições de segurança e diferentes percepções sobre o papel da polícia no cotidiano.
Em conjunto, os gráficos mostram que, embora exista uma tendência geral de rejeição à violência institucional, fatores sociais como gênero e raça ainda estruturam nuances importantes nessas percepções. Esses achados reforçam a necessidade de compreender como marcadores sociais influenciam a relação entre população e forças de segurança, especialmente em um contexto nacional marcado por recorrentes denúncias de abuso policial e desigualdades históricas no tratamento dos grupos sociais.