Sazonalidade por Semana Epidemiológica — Covid-19, Influenza e VSR

Autor

Unidade de Inteligencia e Vigilancia em Saude (UIVS) - SES/SP

Data de Publicação

27 de novembro de 2025

1 Objetivo e racional

Este relatório investiga padrões sazonais semanais para Covid-19, Influenza e Vírus Sincicial Respiratório (VSR) ao longo dos anos, usando:
- Incidência semanal por 100 mil hab. (agregada e por município).
- Métricas sazonais (semana do pico, amplitude, duração da temporada, centro de gravidade temporal).
- Estatística circular para comparar o timing dos picos entre diagnósticos.
- Modelagem com GAM cíclico (captura sazonalidade flexível por semana).
- Correlação e defasagem entre séries (quem antecipa quem).
- Visualizações: heatmap semana×ano, subseries por ano, curvas suavizadas e polar.


2 Construção da incidência semanal

Abaixo calculamos a incidência semanal agregada (somando casos e populações municipais por ano) e forçamos a presença de todas as semanas (1–53) por diagnóstico×ano para evitar “quebras” nas linhas.

Nota de interpretação: usar a população total anual (soma das populações municipais únicas) evita dupla contagem e padroniza o denominador para comparar semanas dentro do mesmo ano.


3 Análises descritivas

3.1 1) Subseries (linhas por ano)

Leitura: picos recorrentes na mesma janela de semanas indicam sazonalidade estável.

Os perfis por ano mostram: Entre 2023–2025, os perfis semanais indicam sazonalidade estável para Influenza (picos SE16–21; maior amplitude em 2025) e VSR (picos SE13–18; amplitude crescente). A Covid-19 mantém pico precoce consistente (SE8–9), porém com queda acentuada de magnitude até 2025; só 2023 teve elevação tardia (SE40–42). Em suma, estabilidade temporal para Influenza/VSR, variabilidade de magnitude para Covid-19.

3.2 2) Heatmap semana × ano

Leitura: faixas verticais mais intensas indicam períodos de maior risco por ano.

Os heatmaps de 2023–2025 mostram “janelas quentes” claras: Influenza concentra-se no miolo do ano (SE15–26), com pico mais intenso em 2025 (SE21, 2,25/100 mil); o VSR antecipa essa janela (SE12–18), com padrão altamente consistente e intensidade crescente até 2025 (SE18, 1,49/100 mil). Já a Covid-19 concentra-se no início do ano (SE1–10), apresenta manchas menos regulares, um aumento tardio em 2023 (SE40–42) e queda marcante de magnitude em 2025 (pico de 0,68/100 mil).

3.3 3) Polar (visão circular do ano)

Leitura: o ângulo (semana) do maior raio indica timing sazonal; “pétalas” alinhadas sugerem consistência anual.

A visualização polar (MA3, 2023–2025) evidencia alto alinhamento temporal para VSR (picos entre SE13–18) e Influenza (SE16–21), com maior amplitude em 2025: VSR 1,49/100 mil (SE18) e Influenza 2,25/100 mil (SE21). Já a Covid-19 concentra-se no início do ano (SE8–10), porém com baixa consistência de magnitude—picos mais altos em 2023–2024, elevação secundária em 2023 (SE40–42) e queda acentuada em 2025 (0,68/100 mil).


4 Métricas sazonais (pico, amplitude, duração, centro de gravidade)

Interpretação guiada

  • semana_pico: quando ocorrem os picos por ano.
  • duracao_sem: tamanho da “temporada” (semanas ≥ P80).
  • centro_grav: “média ponderada” do calendário epidêmico.
  • indice_sazonal: quanto o pico se afasta da média (sazonalidade mais “aguda” = maior valor).

Covid-19: Pico sazonal no início do ano (SE8–9) em 2023–2025; maior pico em 2023 (1,81/100 mil, SE9) e queda marcada em 2025 (0,68/100 mil, SE8). Temporada estável (11 semanas); 2025 teve maior índice de sazonalidade, indicando onda mais aguda apesar da baixa magnitude.

Influenza: Picos no miolo do ano (SE16–21); 2025 apresentou o maior pico (2,25/100 mil, SE21) e o índice sazonal mais alto (5,19), caracterizando temporada mais curta e intensa. Duração: 11–12 semanas.

VSR: Picos precoces (SE13–18) com amplitude crescente (de 0,73 para 1,49/100 mil, 2023→2025) e duração constante (11 semanas). Centro de gravidade ~SE20, anterior ao da Influenza em 2024–2025, sugerindo antecedência temporal.

Em conjunto, 2023–2025 revela sazonalidade consistente: Covid-19 com pico precoce (SE8–9) e menor magnitude recente; VSR abrindo a temporada (SE13–18); Influenza dominando o miolo (SE16–21), com 2025 mais intenso. As temporadas são estáveis (≈11–12 semanas).

4.1 Boxplots comparando diagnósticos


5 Estatística circular (timing dos picos)

Tratamos semana do pico como ângulo no círculo (0, 2π).

O teste de Rayleigh avalia se ângulos/direções estão uniformemente distribuídos no círculo. Para sazonalidade, convertemos a semana do pico em ângulo; H₀: distribuição uniforme (sem sazonalidade). p < 0,05 indica concentração angular dos picos → sazonalidade presente.


       Rayleigh Test of Uniformity 
       General Unimodal Alternative 

Test Statistic:  0.9599 
P-value:  0.0486 

Interpretação: Pico no miolo do ano (SE 16–21); sazonalidade confirmada (Rayleigh: p = 0,0446).


       Rayleigh Test of Uniformity 
       General Unimodal Alternative 

Test Statistic:  0.9694 
P-value:  0.0446 

Interpretação: Pico intermediário-precoce (SE 13–18); sazonalidade confirmada (Rayleigh: p = 0,0446).


       Rayleigh Test of Uniformity 
       General Unimodal Alternative 

Test Statistic:  0.9984 
P-value:  0.0339 

Interpretação: Pico precoce (SE 8–9); sazonalidade confirmada (Rayleigh: p = 0.0339).

Comparação do timing médio dos picos entre diagnósticos (Watson–Williams):

Watson–Williams: teste paramétrico de ANOVA circular que compara as médias angulares entre grupos (ex.: semanas de pico por diagnóstico). Assume concentrações semelhantes entre grupos e testa se os picos médios ocorrem no mesmo momento do ciclo anual.


    Watson-Williams test for homogeneity of means

data:  theta by diagnostico
F = 20.081, df1 = 2, df2 = 6, p-value = 0.002196
sample estimates:
Circular Data: 
Type = angles 
Units = radians 
Template = none 
Modulo = asis 
Zero = 0 
Rotation = counter 
                    mean of Covid-19                    mean of Influenza 
                            1.006899                             2.338864 
mean of Vírus sincicial respiratório 
                            1.893635 

Interpretação: F=20.081, df_1=2, df_2=6, p=0.002196 ⇒ rejeita-se homogeneidade das médias. Os picos médios diferem entre diagnósticos: Covid-19 mais cedo (1.0069 rad ≈ SE 8), VSR intermediário (1.8936 rad ≈ SE 16), e Influenza mais tarde (2.3389 rad ≈ SE 19–20).

Conclusão: Entre 2023–2025, os Testes de Rayleigh indicaram sazonalidade para todos os diagnósticos (p=0,0486; 0,0446; 0,0339). O Watson–Williams mostrou diferenças no timing médio dos picos (F=20,081, p=0,002196), rejeitando homogeneidade. As médias angulares confirmam a ordem temporal: Covid-19 mais cedo (1,0069 rad), VSR intermediário (1,8936 rad) e Influenza mais tardio (2,3389 rad).


6 Modelagem com GAM cíclico (semana ~ s(. , bs = “cc”))

Modelamos a incidência como função suave cíclica da semana; incluímos efeito aleatório de ano para capturar heterogeneidade anual.


Family: gaussian 
Link function: identity 

Formula:
incid_100k ~ diagnostico + s(semana_epi, bs = "cc", k = 20, by = diagnostico) + 
    s(ano, bs = "re")

Parametric coefficients:
                                        Estimate Std. Error t value Pr(>|t|)
(Intercept)                              0.44886    0.02581  17.388  < 2e-16
diagnosticoInfluenza                    -0.16924    0.03162  -5.353 1.38e-07
diagnosticoVírus sincicial respiratório -0.14682    0.03162  -4.644 4.49e-06
                                           
(Intercept)                             ***
diagnosticoInfluenza                    ***
diagnosticoVírus sincicial respiratório ***
---
Signif. codes:  0 '***' 0.001 '**' 0.01 '*' 0.05 '.' 0.1 ' ' 1

Approximate significance of smooth terms:
                                                            edf Ref.df     F
s(semana_epi):diagnosticoCovid-19                     9.039e+00     18 8.776
s(semana_epi):diagnosticoInfluenza                    7.211e+00     18 7.987
s(semana_epi):diagnosticoVírus sincicial respiratório 5.884e+00     18 8.163
s(ano)                                                1.627e-07      1 0.000
                                                      p-value    
s(semana_epi):diagnosticoCovid-19                      <2e-16 ***
s(semana_epi):diagnosticoInfluenza                     <2e-16 ***
s(semana_epi):diagnosticoVírus sincicial respiratório  <2e-16 ***
s(ano)                                                   0.16    
---
Signif. codes:  0 '***' 0.001 '**' 0.01 '*' 0.05 '.' 0.1 ' ' 1

R-sq.(adj) =  0.502   Deviance explained = 52.8%
-REML = 112.37  Scale est. = 0.079466  n = 477


6.1 Curvas previstas por diagnóstico (média nos anos)

Leitura: as curvas suavizadas mostram o “perfil” sazonal médio por diagnóstico e os intervalos de incerteza.

GAM com spline cíclico por semana (2023–2025), o modelo explicou 52,8% da variabilidade (R²aj = 0,50). Os termos sazonais se (semana_epi) foram altamente significativos para Covid-19, Influenza e VSR (p<2e−16), enquanto o efeito de ano não foi significativo (p=0,16). As curvas previstas mostram VSR com pico único na SE≈18, Influenza na SE≈20–22 e Covid-19 com perfil bimodal (pico primário SE 8–10 e secundário SE≈40).


7 Correlação e defasagem entre séries

A seguir calculamos a correlação cruzada (CCF) entre Influenza e VSR, e entre Covid-19 e Influenza, por ano (incidência semanal). Lags positivos significam que a série Y (segunda) ocorre depois da série X (primeira).

7.1 Visualização dos lags máximos e correlações

Interpretação: lag_max > 0 sugere que diag_y tende a picar depois de diag_x naquele ano; observe também cor_max (força da associação).

7.2 Leituras-chave do heatmap:

  1. VSR ↔︎ Influenza

Padrão consistente: VSR precede Influenza.
Defasagem: ~7 semanas (2023) e ~~2 semanas (2024–2025).
Força: forte/muito forte (cor_max 0,71 em 2024 a 0,88 em 2025).

Implica: após o pico de VSR, espera-se Influenza 2–7 semanas depois.

  1. Covid-19 ↔︎ Influenza

Padrão: Covid-19 precede Influenza com defasagens longas.
Defasagem: ~8–14 semanas (menor em 2024: 8, maior em 2025: 14).
Força: moderada a forte (ex.: r=0,43 em 2024; r=0,75 em 2025).

Implica: aumentos de Covid-19 antecipam o ciclo da Influenza, frequentemente mais tarde no ano.

  1. Covid-19 ↔︎ VSR

Padrão: Covid-19 precede Influenza com defasagens longas.
Defasagem: ~8–14 semanas (menor em 2024: 8, maior em 2025: 14).
Força: moderada a forte (ex.: r=0,43 em 2024; r=0,75 em 2025).

Implica: aumentos de Covid-19 antecipam o ciclo da Influenza, frequentemente mais tarde no ano.

Síntese da ordem temporal (padrão dominante 2023–2025):
- Covid-19 → VSR → Influenza, com VSR → Influenza em ~2–7 semanas e Covid-19 antecedendo VSR (4–12 semanas) e Influenza (8–14 semanas).

Força das associações:

VSR–Influenza: altas e estáveis (até r≈0,88).
Covid-19 com VSR/Influenza: moderadas a altas, variáveis por ano (r≈0,43–0,75).

Implicações operacionais:

– Use Covid-19 como marcador inicial da temporada; VSR tende a vir 4–12 semanas depois.
– Após VSR, planeje Influenza em ~2–7 semanas (capacidade assistencial, UTI, testagem, comunicação e reforços vacinais).
Monitorar mudanças interanuais (calendário escolar, clima, cobertura vacinal), pois os lags podem encurtar/alongar.

Notas metodológicas (para transparência):

  • Séries padronizadas por ano antes do CCF (remove nível/escala).
  • Janela ±15 semanas; lag>0 significa Y depois de X.
  • CCF mede associação temporal, não causalidade; sazonalidade compartilhada pode inflar r.

8 Síntese final

  1. Sazonalidade — Os padrões gráficos (Heatmaps e Visualização Polar) e as métricas confirmam sazonalidade consistente para Influenza e VSR. Diferentemente de análises anteriores, o teste de Rayleigh indicou concentração significativa do timing dos picos para todos os três diagnósticos (P-values < 0.05). O Watson–Williams detectou diferença estatística significativa no timing médio dos picos entre diagnósticos (P = 0.002196), com o Covid-19 sendo o mais precoce, seguido pelo VSR e, por fim, pela Influenza.

  2. Timing e intensidade — A média circular dos picos e a análise CCF confirmam que o VSR (pico médio em torno da SE 16) atinge o pico antes da Influenza (pico médio em torno da SE 20). Em 2025, a Influenza exibiu a maior intensidade (pico de 2.25/100k) e o maior índice de sazonalidade (5.19), sugerindo a temporada mais “aguda” do período 2023–2025. A duração das temporadas (duracao_sem) é consistentemente 11 ou 12 semanas para todos os diagnósticos.

  3. Defasagens (CCF) — Entre 2023–2025, observou-se uma ordem temporal sequencial clara: Covid-19 → VSR → Influenza. O VSR consistentemente precede a Influenza por 2 a 7 semanas (correlações fortes, 0.71 a 0.88). O Covid-19 precede o VSR por 4 a 12 semanas (cor: 0.58 a 0.69) e precede a Influenza por 8 a 14 semanas (cor: 0.43 a 0.75).

  4. Modelagem — A Modelagem GAM cíclica se mostrou robusta nesta especificação, com todos os termos suaves sazonais (s(semana_epi)) altamente significativos (p<2e−16). O ajuste do modelo capturou o formato sazonal médio (VSR e Influenza unimodais, Covid-19 bimodal) e explica 52.8% da variabilidade (R2 adj. ≈ 0.502). O termo de efeito aleatório para o ano (s(ano)) não foi estatisticamente significativo (p=0.16), sugerindo que a sazonalidade média domina a variância observada na série.

  5. Covid-19 — No período 2023–2025, o Covid-19 manteve seu pico primário concentrado no início do ano (SE 8–9), com sazonalidade confirmada estatisticamente pelo Teste de Rayleigh. Contudo, a amplitude de incidência variou drasticamente, com picos altos em 2023/2024 e forte queda em 2025 (pico de 0.68/100k).

  6. Implicações operacionais — A sequência de defasagem Covid-19 → VSR → Influenza estabelece janelas de previsão valiosas. O VSR deve ser monitorado como um marcador subsequente ao Covid-19 e antecedente claro do pico de Influenza. Planejar capacidade assistencial e vigilância laboratorial com antecedência de 2 a 7 semanas é crítico para o pico de Influenza, após o pico de VSR. Manter monitoramento semanal é fundamental para capturar variações interanuais na dinâmica de circulação.