1 Introdução

A produtividade dos povoamentos de Eucalyptus spp. em Portugal Continental resulta de uma interação complexa entre fatores edáficos (profundidade e pedregosidade do solo, entre outros) e condicionantes climáticas (precipitação, regime térmico e altitude). Embora esses determinantes sejam reconhecidamente críticos para o rendimento volumétrico anual médio (AMA), a literatura nacional ainda carece de estudos integrativos que quantifiquem, de forma multivariada, a contribuição relativa de cada variável e explorem a existência de macro-ambientes produtivos dentro do território.

Neste relatório aplicamos um pipeline estatístico completo — englobando estatística descritiva, testes não paramétricos, análise em componentes principais (ACP), clusterização hierárquica e regressão linear múltipla com rigoroso diagnóstico de resíduos — aos dados de 50 parcelas distribuídas por cinco grandes regiões (Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve). O objetivo central é:

Caracterizar o padrão espacial das variáveis edafoclimáticas e da produtividade;

Identificar quais fatores diferenciam significativamente as zonas geográficas;

Resumir a estrutura latente dos dados via ACP e verificar a formação de grupos homogêneos de parcelas;

Modelar quantitativamente o AMA em função dos fatores mais relevantes, avaliando a qualidade de ajuste e a capacidade preditiva.

Ao combinar métodos exploratórios e confirmatórios, o estudo fornece uma visão abrangente sobre como clima e solo moldam o crescimento dos eucaliptais portugueses, oferecendo subsídios técnicos para práticas silviculturais direcionadas — como seleção de material genético adequado, delineamento de regimes de manejo e definição de zonas prioritárias para investimento — e contribuindo para o planejamento florestal sustentável em face das variações climáticas regionais.

2 Leitura e inspeção dos dados

## Rows: 50
## Columns: 12
## $ profund  <dbl> 80, 60, 15, 90, 80, 70, 50, 60, 25, 80, 25, 70, 40, 40, 60, 5…
## $ pedreg   <dbl> 35, 70, 60, 15, 35, 25, 30, 40, 35, 15, 40, 10, 50, 20, 50, 3…
## $ pretotal <dbl> 2350, 1300, 1300, 2250, 2150, 1900, 2250, 1000, 1500, 1500, 1…
## $ predia   <dbl> 145, 105, 130, 140, 125, 125, 130, 110, 120, 125, 110, 105, 9…
## $ tempmax  <dbl> 27, 28, 30, 28, 25, 29, 28, 29, 28, 29, 26, 27, 29, 26, 27, 2…
## $ tempmed  <dbl> 12.0, 12.0, 14.0, 15.0, 14.0, 14.0, 13.0, 15.0, 15.0, 16.0, 1…
## $ tempmin  <dbl> 1, 3, 4, 7, 4, 1, 6, 3, 6, 4, 3, 5, 2, 5, 4, 1, 2, 2, 2, 4, 3…
## $ altitude <dbl> 557, 445, 147, 200, 68, 70, 250, 700, 140, 260, 461, 15, 320,…
## $ idade    <dbl> 10, 11, 10, 11, 12, 12, 10, 12, 11, 12, 10, 10, 10, 10, 11, 1…
## $ ama      <dbl> 21.87, 21.36, 15.99, 18.54, 23.67, 20.42, 18.99, 17.81, 15.95…
## $ zona_pt  <chr> "Norte", "Norte", "Norte", "Norte", "Norte", "Norte", "Norte"…
## $ parcela  <chr> "NT1", "NT2", "NT3", "NT4", "NT5", "NT6", "NT7", "NT8", "NT9"…

A base reúne 50 observações e 12 variáveis — dez numéricas e duas categóricas. Não existem valores ausentes, portanto a integridade é total, mas a etapa de imputação por mediana foi mantida para garantir robustez caso futuras atualizações do conjunto contenham lacunas. As variáveis apresentam escalas heterogêneas (milímetros, graus Celsius, centímetros e metros), indicando que a padronização é recomendável antes de aplicar técnicas multivariadas como a análise em componentes principais.

2.1 Percentual de NA

## Percentual de NA gerais: 0 %

2.2 Imputação simples

Não foram detectados valores ausentes em nenhuma das doze variáveis analisadas, evidenciando completude total do conjunto de dados e dispensando estratégias elaboradas de tratamento de missing. Ainda assim, o pipeline preserva um passo de imputação pela mediana para todas as variáveis numéricas.

3 Estatística descritiva

Data summary
Name dados
Number of rows 50
Number of columns 12
_______________________
Column type frequency:
character 2
numeric 10
________________________
Group variables None

Variable type: character

skim_variable n_missing complete_rate min max empty n_unique whitespace
zona_pt 0 1 3 8 0 5 0
parcela 0 1 3 5 0 49 0

Variable type: numeric

skim_variable n_missing complete_rate mean sd p0 p25 p50 p75 p100 hist
profund 0 1 47.20 20.48 15.00 35.00 45.00 60.00 90.00 ▅▇▅▁▃
pedreg 0 1 37.06 18.09 3.00 21.25 40.00 50.00 70.00 ▆▂▇▆▃
pretotal 0 1 1076.00 472.54 550.00 750.00 900.00 1300.00 2350.00 ▇▃▃▁▁
predia 0 1 98.74 22.03 50.00 85.00 95.00 113.75 145.00 ▂▅▇▅▂
tempmax 0 1 29.86 2.78 25.00 28.00 29.00 32.00 36.00 ▅▇▃▆▂
tempmed 0 1 15.39 1.61 12.00 14.50 15.25 16.00 19.00 ▂▂▇▂▂
tempmin 0 1 4.56 2.03 1.00 3.00 4.50 6.00 9.00 ▅▇▃▇▂
altitude 0 1 242.04 164.38 15.00 128.50 197.00 338.75 700.00 ▇▇▃▂▁
idade 0 1 10.90 0.79 10.00 10.00 11.00 11.75 12.00 ▇▁▇▁▆
ama 0 1 13.75 5.01 4.54 10.14 13.76 17.81 23.67 ▅▇▇▆▃

A precipitação total apresenta forte assimetria à direita, variando de 550 mm a 2 350 mm. A chuva diária média segue tendência semelhante. A temperatura mínima oscila entre 1 °C e 9 °C, sugerindo risco de geada em parte das parcelas, enquanto a profundidade do solo varia de 15 cm a 90 cm e a pedregosidade de 3 % a 70 %. A produtividade média (AMA) é de 13,8 m³ ha⁻¹ ano⁻¹ com desvio-padrão de 5,0, indicando alta variação. Esses números já sinalizam que clima e características de solo têm potencial para explicar diferenças de rendimento.

4 Teste de Kruskal–Wallis

Os testes mostram diferenças estatísticas entre zonas geográficas para precipitação total e diária, todas as variáveis de temperatura, altitude e a própria produtividade. Variáveis puramente edáficas, como profundidade e pedregosidade, além da idade dos povoamentos, não diferiram de forma significativa. Conclui-se que a heterogeneidade entre zonas é sobretudo climática e topográfica, o que repercute diretamente no rendimento florestal.

4.1 Boxplots das variáveis significativas

Os boxplots das variáveis com diferença significativa resumem visualmente as disparidades regionais identificadas pelo teste de Kruskal-Wallis. Observa-se que as zonas Norte e Centro concentram medianas mais elevadas para precipitação total, precipitação diária e produtividade (AMA), sugerindo um regime hídrico mais favorável que se reflete no ganho volumétrico anual. Para temperatura máxima, temperatura média e altitude emerge um gradiente latitudinal e altimétrico bem definido: embora existam sobreposições nos intervalos interquartílicos, as medianas evidenciam perfis térmicos distintos entre regiões. Já a temperatura mínima apresenta variação menos pronunciada; a diferença é estatisticamente detectável, mas de magnitude prática modesta. Em síntese, os boxplots corroboram e quantificam a magnitude das divergências apontadas pelos resultados não paramétricos, destacando as variáveis hídricas e térmicas como principais eixos de contraste entre as zonas estudadas.

5 ACP e clusterização

## Kaiser-Meyer-Olkin factor adequacy
## Call: psych::KMO(r = num)
## Overall MSA =  0.73
## MSA for each item = 
##  profund   pedreg pretotal   predia  tempmax  tempmed  tempmin altitude 
##     0.60     0.61     0.74     0.73     0.77     0.75     0.69     0.74 
##    idade      ama 
##     0.39     0.84
## $chisq
## [1] 216.6188
## 
## $p.value
## [1] 2.660493e-24
## 
## $df
## [1] 45

Antes de extrair as componentes principais avaliou-se a adequação da matriz de correlações. O índice Kaiser-Meyer-Olkin global foi 0,73, valor considerado “médio-bom” e suficiente para prosseguir com a ACP; oito das dez variáveis apresentaram MSA ≥ 0,60, reforçando a presença de estrutura latente a explorar. As exceções foram idade (0,39, indício de baixa comunalidade) e, em menor grau, profundidade do solo e pedregosidade (≈ 0,60), sinalizando que esses atributos se relacionam menos com o restante conjunto e poderão contribuir pouco para as componentes finais. O teste de esfericidade de Bartlett resultou em χ²(45) = 216,6 com p < 2,7 × 10⁻²⁴, rejeitando a hipótese de matriz identidade e confirmando correlações significativas entre as variáveis. Em síntese, os requisitos estatísticos para a aplicação da ACP foram atendidos, embora a variável idade deva ser interpretada com cautela ou até excluída em análises complementares devido ao seu baixo índice de adequação.

5.1 Cargas e comunalidades

A análise em componentes principais confirma que os dados se organizam sobretudo em dois eixos latentes. A CP1 (≈ 44 % da variância) é governada pela precipitação—pretotal (0,91) e predia (0,86)—e apresenta cargas negativas nas temperaturas máximas e médias (-0,71; -0,70); por isso traduz um gradiente húmido versus quente, no qual produtividades (ama, 0,85) se associam a ambientes mais chuvosos e ligeiramente mais frescos. Já a CP2 (≈ 18 %) opõe áreas elevadas e pedregosas (altitude 0,64; pedreg 0,71) a zonas mais baixas/menos rochosas, acompanhada por carga negativa de tempmin (-0,58), reforçando o contraste altitude-frio. As comunalidades situam-se entre 0,74 e 0,96, indicando que as duas componentes capturam mais de 60 % da informação original com perda mínima de detalhe.

5.2 Cluster hierárquico

## *** : The Hubert index is a graphical method of determining the number of clusters.
##                 In the plot of Hubert index, we seek a significant knee that corresponds to a 
##                 significant increase of the value of the measure i.e the significant peak in Hubert
##                 index second differences plot. 
## 

## *** : The D index is a graphical method of determining the number of clusters. 
##                 In the plot of D index, we seek a significant knee (the significant peak in Dindex
##                 second differences plot) that corresponds to a significant increase of the value of
##                 the measure. 
##  
## ******************************************************************* 
## * Among all indices:                                                
## * 7 proposed 2 as the best number of clusters 
## * 2 proposed 3 as the best number of clusters 
## * 2 proposed 4 as the best number of clusters 
## * 5 proposed 5 as the best number of clusters 
## * 1 proposed 7 as the best number of clusters 
## * 1 proposed 8 as the best number of clusters 
## * 1 proposed 13 as the best number of clusters 
## * 4 proposed 15 as the best number of clusters 
## 
##                    ***** Conclusion *****                            
##  
## * According to the majority rule, the best number of clusters is  2 
##  
##  
## *******************************************************************

5.2.1 Dendrograma e clusters

5.2.2 Tabela Zona × Cluster

Os indicadores de adequação revelam correlações suficientes para a ACP (KMO global 0,73; teste de Bartlett altamente significativo). As cinco primeiras componentes explicam mais de 80 % da variabilidade total. A primeira componente descreve um gradiente húmido-frio, associado a maior produtividade, versus seco-quente. A segunda opõe altitude e pedregosidade às temperaturas médias. As comunalidades mantêm-se acima de 0,74, indicando perda mínima de informação. O agrupamento hierárquico, com dois grupos sugeridos pelo consenso de índices de validação, separa claramente regiões húmidas e elevadas de regiões quentes e secas, reforçando o peso do clima na organização do espaço produtivo.

6 Regressão linear múltipla

## 
## Call:
## lm(formula = ama ~ profund + pretotal + predia + tempmin, data = treino)
## 
## Residuals:
##     Min      1Q  Median      3Q     Max 
## -5.7314 -1.7025  0.4611  2.0481  4.7953 
## 
## Coefficients:
##              Estimate Std. Error t value Pr(>|t|)  
## (Intercept)  3.553883   3.323226   1.069   0.2934  
## profund      0.046594   0.026986   1.727   0.0945 .
## pretotal     0.003988   0.002216   1.799   0.0820 .
## predia       0.061595   0.042731   1.441   0.1598  
## tempmin     -0.478940   0.244078  -1.962   0.0591 .
## ---
## Signif. codes:  0 '***' 0.001 '**' 0.01 '*' 0.05 '.' 0.1 ' ' 1
## 
## Residual standard error: 2.75 on 30 degrees of freedom
## Multiple R-squared:  0.6855, Adjusted R-squared:  0.6436 
## F-statistic: 16.35 on 4 and 30 DF,  p-value: 3.284e-07

O modelo final de regressão linear, selecionado por critério AIC, retém quatro preditores—profundidade do solo, precipitação total anual, precipitação média diária e temperatura mínima—e explica ≈ 68 % da variabilidade da produtividade (AMA), com R² ajustado de 0,64. O teste F global é altamente significativo (p ≈ 3 × 10⁻⁷), confirmando que o conjunto de regressões melhora substancialmente em relação a um modelo nulo. Entre os coeficientes, todos mantêm os sinais esperados: solos mais profundos (+0,047 m³ ha⁻¹ ano⁻¹ por cm) e maiores volumes de chuva—tanto anual (+0,004 m³ ha⁻¹ ano⁻¹ por mm) quanto diária (+0,062 m³ ha⁻¹ ano⁻¹ por mm)—aumentam a produtividade, enquanto temperaturas mínimas mais baixas a reduzem (-0,48 m³ ha⁻¹ ano⁻¹ por °C), refletindo o efeito limitante do frio. Apesar de os valores-p individuais ficarem no limiar da significância (0,06 – 0,16), a coerência dos sinais, a razoável magnitude dos coeficientes padronizados (β ≈ 0,20-0,39) e a ausência de multicolinearidade preocupante sustentam a relevância prática das variáveis. O erro-padrão residual de 2,75 m³ ha⁻¹ ano⁻¹ gera um RMSE externo de cerca de 4 m³ ha⁻¹ ano⁻¹, o que representa ~30 % da média observada e é aceitável para aplicações de planejamento silvicultural em escala regional.

6.1 Diagnóstico dos resíduos

diag <- broom::augment(modelo)
ggpubr::ggarrange(
  ggplot(diag, aes(.fitted, .resid)) +
    geom_point() + geom_smooth(se=F, col="red") +
    labs(title="Resíduos vs Ajustados",
         x="Ajustados", y="Resíduos") + theme_minimal(),
  ggplot(diag, aes(sample=.std.resid)) +
    stat_qq() + stat_qq_line() +
    labs(title="Q-Q Resíduos",
         x="Quantis teóricos", y="Resíduos padronizados") + theme_minimal(),
  ggplot(diag, aes(.fitted, sqrt(abs(.std.resid)))) +
    geom_point() + geom_smooth(se=F, col="red") +
    labs(title="Escala-Localização",
         x="Ajustados", y="√|Resíduos padronizados|") + theme_minimal(),
  ggplot(diag, aes(.hat, .std.resid)) +
    geom_point() + geom_smooth(se=F, col="red") +
    geom_hline(yintercept=0, lty=2) +
    labs(title="Resíduos vs Alavancagem",
         x="Alavancagem", y="Resíduos padronizados") + theme_minimal(),
  ncol=2, nrow=2
)
## `geom_smooth()` using method = 'loess' and formula = 'y ~ x'
## `geom_smooth()` using method = 'loess' and formula = 'y ~ x'
## `geom_smooth()` using method = 'loess' and formula = 'y ~ x'

6.2 Testes de pressupostos

## 
##  Shapiro-Wilk normality test
## 
## data:  residuals(modelo)
## W = 0.97438, p-value = 0.5742
## 
##  studentized Breusch-Pagan test
## 
## data:  modelo
## BP = 0.30205, df = 4, p-value = 0.9897
##  profund pretotal   predia  tempmin 
## 1.234122 4.418948 3.925897 1.126172
##    profund   pretotal     predia    tempmin 
##  0.1963892  0.3872823  0.2924216 -0.2132032
## 
##  Durbin-Watson test
## 
## data:  modelo
## DW = 1.6001, p-value = 0.123
## alternative hypothesis: true autocorrelation is greater than 0

6.3 RMSE (validação externa)

## RMSE (teste): 4.02

O modelo final, selecionado por critério de Akaike, inclui profundidade do solo, precipitação total, precipitação diária e temperatura mínima. Esses fatores explicam 69 % da variação da produtividade; o sinal dos coeficientes confirma que solos mais profundos e chuvas mais abundantes aumentam o AMA, enquanto temperaturas mínimas mais baixas o reduzem. Apesar de alguns coeficientes exibirem valores-p próximos da significância, o teste F global é altamente significativo, evidenciando boa qualidade global do ajuste.

Os diagnósticos de resíduos confirmam normalidade, homocedasticidade e independência razoável; os fatores de inflação da variância estão abaixo do limiar de preocupação, descartando multicolinearidade severa. A raiz do erro quadrático médio obtida em validação externa é de 4,0 m³ ha⁻¹ ano⁻¹, cerca de 29 % da produtividade média, o que é adequado para fins exploratórios.

7 Conclusão geral

A produtividade dos povoamentos de eucalipto em Portugal Continental é fortemente condicionada por variáveis climáticas, em especial precipitação e temperaturas mínimas, e em segundo plano pela profundidade do solo. A análise multivariada delineou dois macro-ambientes contrastantes — húmido-frio e seco-quente — que reaparecem tanto nos testes não paramétricos quanto nos agrupamentos hierárquicos. O modelo preditivo linear, embora simples, captura a maior parte da variabilidade observada sem violar pressupostos estatísticos essenciais. Recomenda-se, para planejamento silvicultural, priorizar áreas com maior disponibilidade hídrica e solos mais profundos, monitorar eventos de frio extremo e testar extensões do modelo que incorporem relações não lineares ou efeitos aleatórios de localidade para melhorar a extrapolação.